Leia ‘O Italianinho da Rua Borges’, na coluna ‘O Reverso do Óbvio’, por Sarah Tempesta

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Por JornalVozAtiva.com Publicado em 18/06/2019, 10:13 - Atualizado em 04/07/2019, 23:42
Sarah Tempesta é bióloga, colunista no site Global Sustentável e está sempre em busca do reverso do óbvio. Siga no Google News

Eu passava todo dia por aquela rua. Rua do Centro da cidade. Era uma rua estreita, pessoas andando sempre apressadas e indo não sei para que lugar. Lugar qualquer, lugar para a pressa. Lugar sem graça, rua suja e malcheirosa.

Todos os dias aquele menino parado num dos cantos da rua com sua caixa de engraxate, de roupa suja e sorriso bonitinho. Uma toquinha na cabeça e chinelos com tiras de barbante e os dedinhos arrebentados.

Parecia um artista de cinema. Garoto trabalhador, mãos que esticavam um pano cheio de graxa e uma caneta atrás da orelha. A clientela do guri também era sempre a mesma, pessoas que se esqueciam de ter pressa e paravam de frente ao menino para lustrar seus sapatos velhos. Eram clientes de confiança. Certo dia não resisti e perguntei: – Menino quem é você e por favor me diga seu nome!

Com ares de certeza ele me olha e sorri uma resposta:

– Eu sou o “italianinho” aqui mesmo da Rua Borges, eu sou o melhor engraxate desta cidade… Nunca me viu não? Quer engraxar os teus sapatos? Faço preço bom, preço para virar freguês… então se anima a lustrar? Tu tens um “belo” par de sapatos, tem gosto para escolher os sapatos que usa…

Fiquei ali olhando o garoto e o invejei por minutos, pela sua desenvoltura e sorriso ainda de criança, talvez houvesse uma malícia, um traquejo de gente que se cria na rua, ele tinha tudo que eu ainda não tinha: o jeito de lidar com as pessoas, para disfarçar meu embaraço sentei-me e pedi educadamente para que engraxasse meus sapatos.

O guri começou o serviço e eu ali a escutar suas histórias, atentamente ouvia. Engraxate novo ou velho sempre tem boas histórias para contar enquanto trabalham. Mais uma pergunta, não resistia de tanta curiosidade: – Então guri, como uma criança como tu vem parar no meio da rua para trabalhar?

Um sorriso que desarma os prepotentes, era o caso, eu me sentia de certa forma superior, o menino estava aos meus pés a me servir, era só um menino feito para limpar os meus sapatos.  O menino me esclarece o fato: – Eu fico na rua para trabalhar, limpo o sapato das pessoas como tu, para pisarem com os sapatos brilhando no meu chão, e tu me paga.

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