Prosa na Janela: ‘A magia de um pôr do sol em Ouro Preto’, por Roberto dos Santos

Home » Prosa na Janela: ‘A magia de um pôr do sol em Ouro Preto’, por Roberto dos Santos
Por Roberto dos Santos Publicado em 30/11/2020, 16:00 - Atualizado em 30/11/2020, 16:00

E por falar em saudade, devo dizer que ela me pegou. Misturou passado com presente, sonho com realidade e num cenário de pura beleza fez-me reviver lindos momentos.

Chegou quando eu e o silêncio descansávamos desarmados e desprotegidos dos perigos da vida e dos amores incondicionais. 

Eu estava no muro de pedra bem frontal a igreja de Nossa Senhora das Mercês e Misericórdia, a alguns metros da Praça Tiradentes na mais bela Ouro Preto.

O olhar estava no infinito, monumentos históricos figuravam no meu raio de visão escondendo parcialmente ao longe, as cadeias montanhosas, lugar que o sol todos os dias repousava após seu triunfal recolhimento.

Esse ritual diário estava se repetindo, aquele arco de luz incandescente parecia fazer poses ante os inúmeros cliques proferidos dos celulares e máquinas fotográficas.

Era muita gente a observar aquele belo espetáculo de fim de tarde, apenas eu não fazia nenhum tipo de registro, exceto o que ficava gravado em minha retina.

Não era desdém, nem falta de sensibilidade, era que o sol parecia querer dizer alguma coisa. Não conseguia desviar o olhar, mantinha-me rijo com os olhos fitados nele.

O silêncio que estava em mim parecia dialogar com o sol, induzindo-me a um proceder meditativo. Imagens de flores e pássaros coloridos, estrelas, luar, árvores balançando, vento soprando, era o que se passava em meu pensamento.  E o sol continuava rumando para a montanha, e a minha volta eram inúmeras as pessoas a contempla-lo, não que eu não estivesse também, mas no meu caso acontecia um algo mais, e eu não queria desviar minha atenção.

Assim que ele transpôs a montanha, restando apenas uma cor alaranjada a colorir as bordas do monte, tudo se desfez em minha mente. Uma só imagem ficou, porém não estava nítida, uma silhueta graciosa formada na escuridão do meu pensamento, foi o que restou. Não tinha mais sol, as pessoas já estavam indo embora, apenas eu continuava a olhar a montanha. O espetáculo havia terminado, mas para mim algo ainda acontecia.

O silêncio imperava, e mais e mais, ele me projetava na direção da obscuridade. Na minha direção vinha àquela silhueta com contornos de mulher rompendo a escuridão do meu pensamento e se tornando cada vez mais nítida. Até que dei de cara com a saudade. Foi o que senti quando Úrsula parecendo um holograma apareceu diante de mim. Aquela que todos os dias eu via desfilar graciosa, não era um desfilar proposital, mas o natural de uma mulher linda e simples. Deslizava de tão belo que era seu caminhar. Enchia de graça por onde passava. Mas isso não era tudo, Úrsula tinha muitos encantos, seus cabelos então! Volumosos e soltos, às vezes presos como que domados. Meiguice no olhar, fragilidade nata de mulher, sem perder a personalidade forte percebida no tom expressivo da voz. Sorriso contido, porém pronto.

Tudo isso são expressões que descrevem Úrsula, que além dos dotes físicos, tinha um coração de ouro.

Acho que o silêncio e a saudade quiseram me dar de presente, a lembrança de momentos e sensações inesquecíveis, reavivar a chama que em minha alma repousava.

O sol foi embora, a noite chegou, a fraca luz nos lampiões encrustados nas centenárias paredes ouro-pretanas, iluminavam meus passos rumo a minha casa. Úrsula bagunçava meus pensamentos e eu nem sabia por onde ela andava.  Contudo estava feliz, afinal só de vê-la reinar em meu inconsciente, já valia a pena à alegria do reencontro, mesmo sendo através de imagens aprisionadas dentro de mim, oriundas de tempos idos.

Onde está Úrsula? Quem sabe num desses lindos pôr do sol em Ouro Preto eu a encontre, não da forma que hoje encontrei, mas de corpo e alma, e a saudade que tenho se transforme numa explosão de amor.

Deixar Um Comentário