Enquanto muitos moradores de Itabirito, Região Central de Minas Gerais, enfrentam problemas graves como os aluguéis altíssimos que levam as pessoas a morarem em lugares de risco, isso só para citar um, a Câmara Municipal da Cidade decidiu dedicar a última sessão da Casa para aprovar, entre outros, um projeto de caráter conservador. O Projeto de Lei (PL) que cria o "Dia do Orgulho Hétero” foi aprovado em primeira votação pelos vereadores nesta segunda-feira (20/03), sem objeções e por unanimidade.
O PL 63/2023 é de autoria do vereador Pastor Anderson (MDB), também conhecido como “Anderson do Sou Notícia” e foi apresentado com tom jocoso pelo presidente da Câmara, Arnaldo Pereira (MDB), nos minutos finais da Reunião Ordinária transmitida ao vivo no Youtube.
Votaram a favor do PL, 12 vereadores, ou seja, todos os parlamentares da Casa Legislativa, todos homens. São eles: Arnaldo Pereira (MDB), Daniel Sudano (Cidadania), Danilo Grilo (Cidadania), Dr. Edson (Repub.), Fabinho Fonseca (Avante), Igor Junior (PTB), Leo do Social (PSDB), Lucas do Zé Maria (MDB), Márcio Oliveira (Cidadania), Max Fortes (DEM), Paulinho (Repub.) e Renê Butekus (PSD).
Em sua biografia no portal da Câmara Municipal de Itabirito, Pastor Anderson informa que é formado em Teologia pela Escola Bíblica Permanente Sião e presidente da Assembleia de Deus Missão (ministério Itabirito). Ele diz também que seu objetivo é “trabalhar em prol da população de Itabirito, do crente ao ateu, sem distinção de crença, raça ou orientação sexual”.
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Crédito - Reprodução / Redes sociais do vereador.
Participantes que estiveram no plenário, mas não quiseram se identificar por medo de sofrer algum tipo de perseguição, afirmaram que estavam acompanhando a reunião na Câmara quando se depararam com “a péssima surpresa”. “Independente da orientação sexual de cada um, qualquer tipo de preconceito ou violência contra os LGBTQIA+ deveria ser uma luta de toda a sociedade”, defenderam. E sim, há pessoas que lutam diariamente e incansavelmente apenas pelo direito de existir.
Por que existe o dia do Orgulho LGBTQIA+?
A última versão do Observatório de Mortes e Violências LGBTQIA+ no Brasil responde a essa pergunta de forma bem didática, porém, sem tirar a seriedade do assunto em questão: “porque estamos fartos dessa narrativa de morte e violência! E é por isso que, em junho, saímos às ruas, em milhares, para mostrar orgulhosamente que somos muitos, que estamos juntes e que lutamos por nossos direitos. Na contramão da vergonha, compartilhamos a alegria de ser quem somos e de amar quem amamos”.
Alguns dados do Observatório de Mortes e Violências LGBTQIA+ no Brasil
Outra triste realidade, de acordo com o Observatório de Mortes e Violências LGBTQIA+ no Brasil: a população brasileira LGBTQIA+ tem sido vitimada por diferentes formas de mortes violentas desde a colonização do país, mesmo antes das denominações atuais de sexualidade e gênero. Em função da LGBTIfobia estrutural, essas pessoas são colocadas em situação de vulnerabilidade por não se enquadrarem em um padrão socialmente referenciado na heteronormatividade, na binariedade e na cisnormatividade.
O Brasil se constitui como um país extremamente inseguro para essa população, como podemos observar na figura abaixo, que indica uma tendência de crescimento no número de mortes violentas de LGBTQIA+ nas últimas duas décadas, e na descrição de alguns casos ocorridos em 2021. É importante constar que esse aumento no número de mortes está atrelado à articulação e atenção que o movimento LGBTQIA+ tem dado a tal demanda, já que a violência sempre ocorreu historicamente, mas não se tinha um esforço de mensurá-la e combatê-la.
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Dados do coletivo apontam que entre 2000 e 2021, 5.362 (cinco mil e trezentas e sessenta e duas) pessoas morreram em função do preconceito e da intolerância de parte da população e devido ao descaso das autoridades responsáveis pela efetivação de políticas públicas capazes de conter os casos de violência. Em 2021, registramos um total de 316 mortes de pessoas LGBTQIA+.
Trâmites
Agora serão necessárias mais duas votações e a sanção do prefeito para que essa proposta vire definitivamente uma lei e passe a fazer parte do calendário oficial do município. “É preciso fazer algum tipo de pressão para que essa lei, fruto de um novo fundamentalismo político-empresarial, não tome ainda mais corpo”, afirmou uma das pessoas presentes que também pediu para não ser identificada.
Resposta
Matéria atualizada às 15h57, logo após o envio da nota de esclarecimento da Câmara Municipal de Itabirito. Leia, abaixo, a íntegra do documento:
Nota da Câmara de Itabirito – 21/3/2023
Em relação ao Projeto de Lei (PL) nº 63/2023
Antes de ser votado pelo Plenário, como todo PL, o projeto passou pela Assessoria Jurídica da Câmara, que atestou que não há inconstitucionalidade.
“A Constituição Federal cuidou de dar autonomia aos Estados e Municípios para que, visando o interesse local, editassem leis que regulamentassem assuntos do interesse próprio de tais entes, determinando o respeito aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art. 37 CF)”, relatou o parecer.
O parecer também cita a Lei Orgânica: “O presente Projeto (…) encontra-se respaldado no ART. 13 da Lei Orgânica, que, na sua essência, fora inspirado no ART. 30, I da Constituição Federal”.
O parecer conclui: “O presente PROJETO DE LEI preenche todos os requisitos insculpidos no Processo Legislativo e respeita as normas constitucionais, podendo ser enviado para votação em Plenário, devendo a Comissão de Redação final realizar as modificações necessárias de redação do Projeto de lei, de acordo com a LC 95/98”.
O PL ainda passou pela Comissão de Legislação e Justiça pela Comissão de Serviços Públicos Municipais. Já no Plenário, o projeto foi aprovado por 12 vereadores em primeira discussão. Para ser aprovado, precisa ser aprovado ainda em segunda discussão e em redação final.
São 13 vereadores em Itabirito. O presidente, por sua vez, vota somente em caso de empate.
Para saber o que o edil pensa a respeito do Projeto de Lei e o porquê do voto favorável, cabe a cada um deles se expressar individualmente. Em outra ponta, cabe ao autor do PL defender sua intenção com o projeto.
Na justificativa, o autor fala, entre outros argumentos, que “garantias devem ser estendidas a toda a população, e não restrita a um grupo”.
Atenciosamente,
Câmara Municipal de Itabirito.
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