Vale é multada por Secretaria de Estado de Meio Ambiente após informações da CPI de Brumadinho

Comissão ouve gestores ambientais e estuda pedir prisão preventiva de responsáveis por laudo da barragem.

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Por JornalVozAtiva.com Publicado em 28/05/2019, 12:39 - Atualizado em 04/07/2019, 23:29
Participantes fizeram um minuto de silêncio em homenagem às vítimas de Brumadinho. Crédito-Guilherme Dardanhan. Siga no Google News

A Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Semad) multou a Vale por desconsiderar as recomendações das consultorias Potamos e Tüv-Süd, contratadas pela empresa para atestar a segurança da barragem que se rompeu em Brumadinho (Região Metropolitana de Belo Horizonte). A informação foi divulgada pelo titular da pasta, Germano Gomes Pereira, um dos convocados para a reunião desta segunda-feira (27/5/19), da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Barragem de Brumadinho.

Realizada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), a reunião foi acompanhada por familiares de algumas das 244 vítimas do rompimento da estrutura em 25 de janeiro deste ano. Eles protestaram contra a atuação do Governo do Estado, empunhando faixas com os nomes dos 26 desaparecidos na tragédia.

A resposta do secretário Germano Pereira surgiu após questionamento do relator da CPI, deputado André Quintão (PT), sobre se a Semad tinha conhecimento das recomendações das auditorias à Vale. O parlamentar colocou em linhas gerais que a Potamos havia recomendado à mineradora reforços na barragem enquanto a Tüv-Süd tinha solicitado o rebaixamento da estrutura.

O gestor da Semad respondeu que soube há pouco tempo dessas recomendações e, quando tomou conhecimento, solicitou a emissão do auto de infração à Vale. A justificativa foi a empresa ter prestado informações falsas ao omitir o fato de que as consultorias tinham comunicado riscos na barragem e, ainda, devido à mineradora não ter tomado as devidas providências.

Riscos não impediram laudo favorável

André Quintão citou vários dados que mostravam a movimentação anormal no maciço da barragem antes de seu rompimento: aumento do nível freático, queda do fator de segurança, nascente vertendo água para a estrutura, piesômetros acusando alterações a partir de dezembro de 2018. “Por que, durante todo esse tempo, a Semad não tomou providências?”, indagou.

Germano respondeu que em nenhum momento, foi informado de qualquer irregularidade. O secretário completou que o Sistema de Gestão de Barragens é gerido pela Agência Nacional de Mineração (ANM), que deve comunicar à Semad as anormalidades. “Não foi relatada qualquer alteração que comprometesse a segurança”, reforçou.

O gestor ainda destacou que a barragem B1 foi fiscalizada pela Semad em 2017 e em novembro de 2018. André Quintão questionou se nessas ações tinha sido encontrado algum indício de desconformidade quanto à manutenção ou funcionamento inadequado da estrutura. O secretário ponderou que a fiscalização da secretaria é diferente da realizada pela ANM. “Naquilo que cabe à Semad, o laudo de 2017 mostrou que não havia nenhum tipo de lançamento de rejeitos na barragem, o que se repetiu em 2018”, respondeu ele, deixando com a CPI cópia desses documentos.

Contaminação – Em relação ao monitoramento da qualidade da água após o rompimento, Germano Pereira informou que “a bruma de rejeitos da mineração não atingiu ainda o Rio São Francisco, mas a represa do Retiro Baixo, em Pompéu (Central)”. Completou que valores mais elevados de contaminação foram observados nos primeiros 40 km do local do rompimento, inclusive de chumbo e mercúrio. “Já no reservatório de Três Marias não foi observado impacto”, registrou.

Por último, André Quintão questionou ao secretário se o atual modelo de licenciamento não seria insuficiente, por atuar de modo formalista. “Todos esses fatos nos levam a crer que há manipulação do índice de segurança; sendo assim, a mineradora não pode exercer pressão indevida sobre quem emite o laudo?”.

Na opinião de Germano Pereira, é responsabilidade do empreendedor reportar imediatamente irregularidades: “É ele quem conhece a estrutura, pois foi quem a criou”. O gestor concordou que o modelo deve ser aperfeiçoado. “O licenciamento deve estar integrado a outras políticas públicas e não ser visto como um fim em si mesmo. Mesas de conflitos ambientais e sociais podem ser agregadas no licenciamento”, sugeriu.

Também propôs a independência das auditorias, o que estaria sendo proposto em legislação federal, com o cadastramento prévio dessas empresas.

“Órgãos de fiscalização têm se esquivado de sua responsabilidade”, diz deputado

Ao comentar audiências com membros dos órgãos fiscalizadores de barragens, o deputado Sargento Rodrigues (PTB) considerou que todos têm se esquivado. Citou documento da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), falando do programa de gestão de barragens, que seguiria as recomendações das auditorias.

“E aí me lembro das recomendações feitas pela Potamos e pela Tüv-Süd, que não foram observadas pela Feam nem por nenhum outro órgão ambiental. Pensaram no interesse econômico, na geração de empregos, mas esqueceram das vidas humanas”, lamentou. O secretário Germano Pereira prestou contas da fiscalização: 270 barragens fiscalizadas em 2017, 300 em 2018 e 80 em 2019.

Sargento Rodrigues lembrou a Germano que, após a tragédia de Brumadinho, não dá mais para os representantes do governo dizerem que não conhecem “a picaretagem da Vale, da Tüv-Süd”. O secretário respondeu que, com base nas informações colhidas na CPI, foi lavrado o auto de infração.

O deputado perguntou então quais as providências concretas que a Semad e seus órgãos coligados estão tomando em relação as barragens da Vale. Germano Pereira informou que foram publicadas duas resoluções: uma sobre descaracterização de barragens e outra sobre suspensão de licenças. Ele sugeriu à CPI a criação de um grupo coordenador, composto por todas as entidades.

Ele afirmou discordar da forma de composição do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam). “Pensamos em um modelo que iguale em representação o setor produtivo e as organizações não governamentais”, destacou.

Já a deputada Beatriz Cerqueira (PT) questionou o secretário sobre o acompanhamento das ações da Vale após o rompimento. “Eu não concordo que o criminoso cuide da cena do crime”, pontuou. Germano afirmou que o monitoramento da Vale subsidia a Semad, mas que há análises próprias, como aquelas feitas no laboratório do Instituto Mineira de Gestão das Águas (Igam).

Questionado sobre a participação da sociedade civil no processo de licenciamento, que não teria sido considerada, o secretário admitiu que as audiências prévias com a população podem ser aperfeiçoadas.

Gestores reafirmam que se basearam nos laudos

A comissão ouviu ainda Anderson Silva de Aguilar, secretário adjunto da Semad, e Rodrigo Ribas, superintendente de Projetos Prioritários da secretaria. Ambos reiteraram que o órgão não tem atribuição de analisar relatório de estabilidade de barragem, o que é feita pela Agência Nacional de Mineração (ANM).

“Tínhamos declaração de auditor internacional independente atestando a estabilidade. Tanto as declarações ordinárias quanto a extraordinária pedida em função do descomissionamento da mina. A ANM tem expertise. Não houve o contraditório de nenhum dos órgãos envolvidos”, enfatizou Anderson Aguilar.

Segundo ele, a Samarco era a referência na área ambiental até a tragédia de Mariana (Central). Depois, a vale passou a ser essa referência, com os melhores analistas internacionais de avaliação de barragens. “Toda a sociedade e os órgãos públicos acreditaram nas condições da estrutura”, reforçou.

Rodrigo Ribas fez colocação semelhante. “Não tínhamos elementos para desconfiar dos estudos”, afirmou. A falsidade do laudo de estabilidade, de acordo com o superintendente, ficou conhecida somente depois.

Questionado por Sargento Rodrigues sobre encontros entre representantes da Vale e conselheiros na véspera da audiência de licenciamento, Anderson Aguilar afirmou não concordar com isso, mas a decisão, segundo ele, cabe a cada um dos conselheiros, que representam diferentes entidades.

Prisão – Para Sargento Rodrigues, a CPI tem elementos suficientes para pedir a prisão preventiva de Makoto Namba, da Tüv Süd e César Grandchamp, da Vale, que assinaram o laudo de estabilidade da Barragem de Brumadinho.

“César buscou a licença na ANM e no Copam, sabendo do histórico de problemas da estrutura. Pelo mesmo motivo, a Vale pode ser enquadrada com dolo eventual, porque sabia dos riscos”, frisou o deputado.

Vários deputados participaram da audiência e questionaram os convidados sobre possíveis falhas na fiscalização da barragem em Brumadinho, bem como sobre pontos que podem ser aperfeiçoados na legislação ou no funcionamento dos órgãos ambientais.

Consulte o resultado da reunião.

Assessoria de Imprensa/ALMG

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