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Leia “Obrigado, não!”, pelo jornalista Éverlan Stutz  

"Na década de 1980, Rita Lee musicou que “dondoca é uma espécie em extinção” e muita gente nem deu atenção ao enunciado pop", escreve Stutz.

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Por Éverlan Stutz Publicado em 02/01/2025, 11:15 - Atualizado em 02/01/2025, 11:17
Éverlan Stutz é jornalista, poeta e compositor Siga no Google News

Parece que aquele clichê machista, que limitava o espaço político-social da mulher à cozinha, tornou-se mais um equívoco, mais uma banalidade repetida com frequência pelo senso comum. Elas não fugiram à luta e conseguiram mostrar suas habilidades além do tanque e do fogão. Essa conquista não está consagrada com equidade de oportunidades em todas as áreas de atuação profissional, mas as mulheres estão quebrando tabus e encantando o mundo com uma fragilidade que não passa de pura balela.  

Na década de 1980, Rita Lee musicou que “dondoca é uma espécie em extinção” e muita gente nem deu atenção ao enunciado pop. Em pleno processo de redemocratização, Rita deixava ironicamente o seu “sexo frágil” e nem por isso era bom provocar. Entre uma provocação e outra, elas conquistaram direitos que foram negados por um sistema político-patriarcal que ainda defende práticas arraigadas em princípios religiosos medievais que colocam mulheres cis, travestis e mulheres trans em situação de vulnerabilidade psicossocial. Elas não são vulneráveis. Foram vulnerabilizadas! Não tiveram escolha. Foram obrigadas!    

Mas falemos de Rita e de outra composição que revela o tipo de fragilidade que a cantora se referia, uma fragilidade inteligente, reinterpretada para não assustar os machistas inconformados com as conquistas feministas. Na canção Todas as mulheres do mundo, a compositora profetiza novos avanços de comportamento e repete incansavelmente que “toda mulher se faz de boba e coitada”. No final, para comprovar essas transformações, Rita Lee cita algumas mulheres que conquistaram respeito profissional e que provocaram mudanças expressivas de conduta, como a atriz Leila Diniz que chocou a moralidade e “os bons costumes” ao exibir sua gravidez de biquíni na praia, em épocas de censura e ditadura militar.  

Rita Lee também se irritou com a vulgarização da mulher brasileira, tratada generalizadamente como um típico produto da terra do carnaval, um atrativo a mais para os gringos desavisados, um ser fruta, sem conteúdo. Na música Pagu, uma homenagem à escritora Patrícia Galvão, a rainha do rock nacional canta que “nem toda brasileira é bunda.” Sem silicone, mas com “peito” para encarar os moralistas, Rita Lee abriu um campo de reflexão acerca do papel da mulher na sociedade. Ao abordar a condição feminina pelo viés cômico, nossa rainha subversiva mostra que, apesar da sua partida em 8 de maio de 2023, sua obra continua atual e provocativa. Por isso não provoque, é cor de rosa choque! Salve Rita!  

Mas será que apenas mulheres sofrem com restrições políticas e sociais? Com a negação de direitos essenciais? O machismo, sustentado também por muitas mulheres, demonstra que devemos ampliar o debate sobre igualdade de gênero e LGBTfobia. A comunidade LGBTQIAPN+ também luta pela legitimidade de direitos que foram historicamente negados como o casamento homoafetivo. A crença conservadora é um verdadeiro culto à proibição, um câncer cravado em nossa sociedade que banaliza a reprodução cultural do estupro, que incentiva a violência contra mulheres, que negligencia a grande incidência de assassinatos de travestis, mulheres trans, gays e lésbicas. A música Obrigado não, do álbum Santa Rita de Sampa de 1997, é profético quando Lee canta “Casamento gay além de opção, é controle de população”. Ela não era obrigada a nada.  

A luta por igualdade de gênero ultrapassa questões ideológicas e mostra o quanto os direitos humanos foram e são desrespeitados no Brasil. Os conservadores referem-se aos direitos humanos como “os direitos dos manos”, um meio escroto de marginalizar uma conquista histórica que foi a criminalização da LGBTfobia, que hoje é considerado um crime de ódio, imprescritível e inafiançável.  A Rainha do Rock Brasileiro faria 77 anos nesta terça-feira (31) e seu cântico “cor de rosa choque” tem ecoado neste país-continente. Rita deixou um legado de irreverência e inconformismo. É necessário que o “cor de rosa choque” ande de mãos dadas com as cores vivas do arco-íris. Então respeitem as minas e as monas também. E o mantra deste século é um tributo à autonomia e à escolha pessoal. E como é educada e irônica essa expressão. Não, obrigado!  

Rita Lee nasceu em 31 de dezembro de 1947 em São Paulo . O álbum Santa Rita de Sampa foi lançado em setembro de 1997. Crédito - Reprodução.

Éverlan Stutz
Tel (71) 9 9645-5959
Jornalista (7011/MG)
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