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Desdobramentos sobre o caso Brumadinho podem marcar novo capítulo

A luta pela responsabilização dos culpados tem sido o principal foco de familiares e entidades.

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Por JornalVozAtiva.com Publicado em 10/10/2024, 11:23 - Atualizado em 10/10/2024, 11:23
Representantes da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão (AVABRUM) e Instituto Cordilheira estiveram presentes na audiência na sede da CVM em 1º/10. Crédito — Emily Maya / Justiça Global. Siga no Google News

Cinco anos e nove meses depois do crime que matou 272 pessoas e causou um dos maiores desastres ambientais e humanitários do país, familiares das vítimas da tragédia em Brumadinho continuam na busca por justiça. O sistema de justiça brasileiro não responsabilizou ninguém até hoje. Um dos desdobramentos sobre o caso no mercado financeiro pode iniciar um novo capítulo na vida dessas pessoas.

No dia 1º/10, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) deu início ao julgamento do ex-diretor de Ferrosos e Carvão Gerd Peter Poppinga, e do ex-presidente da Vale S.A. (VALE3) Fabio Schvartsman, acusados de negligência e omissão no rompimento da Barragem B1 da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), em 2019. O relator do caso, diretor Daniel Maeda, votou pela condenação de Poppinga e pela absolvição de Schvartsman. Entre as penas administrativas está o pagamento de R$ 27 milhões. A pedido de vista de outro diretor da CVM, Otto Eduardo Fonseca Lobo, o julgamento foi interrompido e deve ser retomado em até 60 dias úteis.

A sessão foi o desdobramento da ação movida pela Superintendência de Processos Sancionadores da Autarquia a partir de queixas apresentadas por acionistas críticos da mineradora em 2019, mesmo ano da tragédia.

Há 14 anos, os acionistas críticos da Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale utilizam estratégias de contra-narrativa para apresentar seus votos contrários às decisões corporativas que reforçam ou promovem crimes e violações de direitos humanos.

Veja a publicação lançada nos 10 anos de Acionistas Críticos https://atingidosvale.com/acionistas-criticos-10-anos-de-atuacao-da-articulacao-internacional-dos-atingidos-e-atingidas-pela-vale/

"Durante as assembleias da empresa, as comunidades e outras partes interessadas, representadas pelas pessoas que se tornam acionistas críticas, se manifestam sobre os contínuos impactos sociais e ambientais da Vale, destacando as contradições entre a narrativa criada pela empresa para os investidores e a realidade no local. Os investidores devem ir além dos relatórios da Vale para ter uma visão completa, e devem tomar medidas para responsabilizar a empresa pelos danos passados e atuais", diz Fernanda Martins, Secretária-Executiva da Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale.

Luta em meio ao luto

A vida dos moradores de Brumadinho nunca mais foi a mesma desde 25 janeiro de 2019, data do rompimento da Barragem B1 da Mina Córrego do Feijão, que liberou 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro. No total, 272 vidas foram perdidas, enquanto três vítimas ainda não foram encontradas.

Jacira Francisca Costa, que perdeu seu filho, Thiago Mateus Costa, segue na luta por justiça desde o rompimento da barragem, atuando na linha de frente pela defesa dos direitos e memória das vítimas.

“No marco de 5 anos e 8 meses do crime, estamos aqui para acompanhar presencialmente esse julgamento na CVM. Não vamos parar. Saímos de Minas Gerais para deixar claro para todos que nós não vamos parar até que a justiça seja feita. Voltaremos quantas vezes forem necessárias. Desistir não é uma opção”, afirmou a Diretora da AVABRUM.

Moradoras de Brumadinho, da comunidade da Jangada, vizinha do Córrego do Feijão, acompanharam as operações da Vale S.A. no Complexo Paraopeba desde 2010. Segundo elas, desde muito antes da tragédia já havia desentendimentos entre os moradores e a mineradora, especialmente devido aos impactos nas nascentes de abastecimento humano e qualidade ambiental da região.

"A população alertou as autoridades públicas, em diversas ocasiões, sobre a falta de rigor no processo de licenciamento ambiental da ampliação e continuidade das minas do Córrego do Feijão e Jangada, ambas do Complexo Paraopeba, da Vale S.A. Um dos fatos mais impressionantes foi a manobra sobre o porte e o potencial poluidor do empreendimento. Ele sempre foi classificado como Classe 6 (maior nível de impacto ambiental) e foi re-orientado para Classe 4 (médio impacto), sem nenhuma explicação técnica plausível" explica Maria Teresa Corujo, diretora do Instituto Cordilheira e integrante do Movimento pelas Serras e Águas de Minas Gerais.

Para além das perdas de entes queridos, o rompimento da barragem também provocou uma devastação ambiental de enormes proporções. Parte dos rejeitos ficou na área afetada, enquanto outra parte foi transportada pelo ribeirão Ferro-Carvão até sua confluência com o Rio Paraopeba, impactando 26 municípios da bacia do Paraopeba.

Ferramenta online: acervo reúne linha do tempo sobre os processos criminais

O Observatório das Ações Penais sobre a Tragédia de Brumadinho, lançado no início de 2024, é fruto da articulação entre coletivos da sociedade engajados pela justiça e contra a impunidade. Documentos oficiais estão disponibilizados na internet e organizados em uma linha do tempo. Qualquer pessoa tem acesso e pode monitorar o andamento dos processos criminais, inclusive, avaliar como as instituições de justiça estão atuando neste caso, que foi o segundo rompimento de barragem da Vale S.A. de grandes proporções em Minas Gerais.

“A coleta, identificação e agrupamento em um só lugar de todo o material que foi gerado nestes quase seis anos é um rico acervo para eternizar o que aconteceu em Brumadinho. Divulgar informações também é uma forma de fazer justiça e não deixar que o que aconteceu se apague com o tempo”, diz Danilo Chammas, advogado da AVABRUM (Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem de Brumadinho e Córrego do Feijão) e membro do Instituto Cordilheira.

Pela plataforma, é possível acompanhar não apenas os processos criminais que tramitam na justiça brasileira, mas também os desdobramentos da queixa crime apresentada por cinco mulheres, familiares de vítimas fatais, no Ministério Público de Munique. Lá está localizada a sede global da TÜV SÜD, a certificadora alemã que atestou a estabilidade da barragem meses antes de seu colapso.

Em janeiro de 2020, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG) ofereceu denúncia de homicídio doloso duplamente qualificado, contra 16 pessoas físicas, incluindo o ex-presidente da companhia mineradora, que também enfrenta o julgamento em andamento na CVM. Essas mesmas pessoas e as empresas Vale S.A. e Tüv Süd Bureau de Projetos Ltda (subsidiária no Brasil da companhia alemã Tüv Süd) respondem também por diversos delitos previstos na Lei de Crimes Ambientais.

Em 2023, a ação penal foi remetida para a Justiça Federal. Até o momento, os responsáveis pela perda irreparável de vidas humanas ainda não foram julgados.

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