A desativação de uma das barragens de mineração a montante consideradas de alto risco em Minas Gerais, a estrutura de Forquilha III, pertencente à Vale em Ouro Preto, deve levar mais de uma década além do prazo inicial previsto em lei. A informação foi divulgada durante uma audiência pública tensa realizada nesta segunda-feira (5/5/25) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), promovida pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
Inicialmente, a Lei “Mar de Lama Nunca Mais”, sancionada após a tragédia de Brumadinho em 2019, que vitimou 272 pessoas, estipulava um prazo de três anos para o descomissionamento dessas estruturas perigosas, com vencimento em 2022. Contudo, a previsão para a desativação de Forquilha III foi postergada para 2035, um atraso de 13 anos em relação ao estabelecido legalmente.
Apesar da significativa ampliação do cronograma, representantes do governo estadual e do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) defenderam os novos prazos, definidos por meio de Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) firmados com as empresas mineradoras. O diretor de Gestão de Barragens da Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam), Roberto Gomes, informou que apenas 21 das 54 barragens a montante existentes no estado foram desativadas até o momento. Ele alertou que duas das 33 ainda em operação – Serra Azul, em Itatiaiuçu, e a própria Forquilha III – permanecem classificadas no nível 3 de risco, o mais elevado.
Gomes justificou a extensão dos prazos, argumentando que uma drenagem acelerada da água presente nas barragens a montante poderia comprometer a estabilidade das estruturas, elevando o risco de novos desastres. “Por isso, três anos pode não ser suficiente para garantir a segurança”, ponderou. Ele também revelou que 14 mineradoras aderiram aos TACs para a revisão dos prazos, enquanto três empresas – Minar Mineração Aredes Ltda, Serra da Fortaleza Mineração e Metalurgia Ltda e Mineração Geral do Brasil (MGB) – responsáveis por quatro barragens, ainda não o fizeram.
Tanto Roberto Gomes quanto o promotor de Justiça João Paulo Alvarenga Brant, do MPMG, enfatizaram que os TACs representam a via mais eficaz para garantir a desativação, diante da lentidão e complexidade de processos judiciais envolvendo as empresas recalcitrantes.
O presidente da Comissão de Meio Ambiente da ALMG, deputado Tito Torres (PSD), alinhou-se aos argumentos técnicos e jurídicos apresentados pela Feam e pelo Ministério Público, declarando que, apesar de não ser o cenário ideal, os TACs evitam uma judicialização prolongada.
A deputada Beatriz Cerqueira (PT), autora do requerimento para a audiência, criticou veementemente a forma como o governo Romeu Zema conduziu a alteração dos prazos, sem o devido debate legislativo. “Se o governo Zema tinha a avaliação de que o tempo não era tecnicamente satisfatório, enviasse à Assembleia um projeto de lei. Tinha uma lei estadual. A Assembleia foi desconsiderada nesse processo”, lamentou, ressaltando a demora do governo em regulamentar o prazo inicial da lei.
A parlamentar também denunciou que a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) tentou, sem sucesso, questionar judicialmente um artigo da lei que impede o licenciamento ambiental para empresas que descumprem as normas.
Outra crítica contundente partiu da deputada Bella Gonçalves (Psol), que apontou o descumprimento da proibição de alteamento de barragens em áreas de autossalvamento, citando o caso de Conceição do Mato Dentro. Ela acusou ainda o governo estadual de utilizar decretos de desapropriação para remover moradores dessas áreas, permitindo a continuidade de ampliações de barragens, o que foi parcialmente contestado pelo representante da Feam, que negou que a barragem em questão fosse a montante.
Um panorama nacional da situação foi apresentado por Eliezer Gonçalves Júnior, da Agência Nacional de Mineração (ANM), que revelou que Minas Gerais concentra 62% das barragens a montante ainda ativas no Brasil, com a presença desse tipo de estrutura em outros oito estados. A audiência evidenciou a complexidade e a lentidão do processo de eliminação das barragens a montante em Minas Gerais, gerando preocupações sobre a segurança das comunidades e o cumprimento da legislação.

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