Escritora de Mariana-MG se reinventa e cria jeito inédito de se fazer poesia

De acordo com Andreia Donadon, A “Quinta” surge como uma nova proposta poética e pode ser produzida por todos os públicos. O novo fazer poético foi aderido por poetas de todo o país.

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Por João Paulo Silva Publicado em 10/01/2020, 11:35 - Atualizado em 10/01/2020, 11:34
Foto-A escritora, poeta e artista plástica Andreia Donadon Leal. Crédito-Divulgação. Siga no Google News

A escritora aldravista e educadora, Andreia Donadon Leal, baseada em Mariana (MG), acaba de criar um estilo inédito de poesia. Trata-se da “Quinta”, uma forma poética composta de cinco versos.

A “Quinta” é formada por quatro primeiros versos de dois vocábulos/ último univocabular; com rima no segundo e quinto verso. Segundo a escritora, “a Quinta é uma nova proposta poética para ser produzida por todos os públicos”. 

A data de criação da “Quinta” aconteceu no dia 23 de dezembro de 2019. A poesia foi bem recepcionada por inúmeros internautas; com criação de um Grupo de Quintanistas com mais de cento e noventa participantes. “É investimento na Arte da Palavra no ano de 2020. É a cidade de Mariana, reforçando a primazia na arte literária”, reforça a escritora.

Saiba mais

A poeta Andreia Donadon Leal propôs e publicou em sua rede social, em 23 de dezembro de 2019, uma forma poética, poema autônomo, variante da quintilha, a que denominou de quinta. Logo em seguida, dezenas de poetas passaram a produzir quintas e publicá-las com esse nome.

Confira AQUI o Grupo dos Quintanistas.

Mas o que é quinta?

O poeta J. B. Donadon Leal explica que embora com pouca frequência, estrofes de cinco versos são encontradas na poesia. “A quintilha clássica caracteriza-se pela composição de estrofes de cinco versos metrificados, de redondilhas menores a maiores. Estrofes de cinco versos metrificados com mais de nove sílabas são denominadas de quintetos”.

“Álvaro de Campos nos apresenta o seu belíssimo poema “O menino da sua mãe”, composto de seis quintilhas hexassilábicas”, confira:

No plaino abandonado
Que a morna brisa aquece          
De balas traspassado    
– Duas, de lado a lado –, Jaz morto, e arrefece.

Raia-lhe a farda o sangue.
De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue,
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos.

J. B. Donadon Leal* explica ainda que os jogos de rimas acontecem entre primeiro, terceiro e quarto com a rima A e segundo e quinto com a rima B. “Já Cecília Meireles, no poema “A doce canção”, dedicado a Christina Christie, compõe suas cinco estrofes em quintilhas de redondilhas maiores, com jogos diferenciados de rimas, numa espécie de dança a demonstrar a musicalidade da canção”.

“Pus-me a cantar minha pena
com uma palavra tão doce,
de maneira tão serena,
que até Deus pensou que fosse
felicidade – e não pena.

Anjos de lira dourada
debruçaram-se da altura.
Não houve, no chão, criatura
de que eu não fosse invejada,
pela minha voz tão pura”.

“Há de se deixar claro, de início, que há, por certo, poemas autônomos de cinco versos, no entanto a quintilha ou o quinteto são denominações de estrofes componentes de poemas maiores e não de poema autônomo e completo”, pontua Donadon.

Novidade

“A novidade se dá pela apresentação formal de um acréscimo, de uma modificação ou de uma criação in totum de algo, com sua consequente denominação. É a denominação, o batismo com um nome, que aufere identidade a algo, diferenciando-o do acaso. Mesmo que a criação, seja pelo processo do acréscimo, da modificação ou da criação in totum, o fato de perceber o resultado como algo que se presta à autonomia identitária o credencia ao batismo e à reivindicação de autoria. É isso que aconteceu com a criação da quinta”.

A quinta resulta da reflexão aldravista de auferir à palavra o status de unidade básica da poesia. Percebam que a poesia clássica tem como unidade básica a sílaba, da qual resultam os jogos métricos e os jogos de rimas. A primeira experiência poética, de que tenho notícia, de utilização da palavra como unidade poética é a aldravia, em que, não importa o tamanho da palavra, o número de sílabas, cada um dos seus seis versos é composto por uma palavra.

“Aí, sim, a palavra conquista o status de unidade básica da poesia. Quinta é, portanto, “poema autônomo” (e não apenas estrofe de poema) de cinco versos, sendo que os quatro primeiros são compostos cada um com duas palavras e o quinto verso com uma única palavra, com o segundo verso rimando com o quinto; primeiro, terceiro e quarto versos no estilo verso livre. Isto, e apenas isto!”.

É trilhando por esse caminho que Andreia Donadon Leal propôs a quinta.  Não importa o número de sílabas na composição métrica dos versos. Importa que cada verso tenha o número de palavras determinado na composição poética que, no caso da quinta, é 02 / 02 / 02 / 02 e 01.

“Essa composição alcança também um outro espírito aldravista – o da liberdade. O exercício da liberdade está na utilização da palavra plena e farta de significação, sem as amarras métricas. Mas, como os conceitos de liberdade ao longo da história da filosofia e do direito sempre esbarrou em sua relatividade, obrigações sempre acompanham, compulsoriamente, o exercício da liberdade”.

“No caso da composição da quinta, a obrigação de usar dois vocábulos nos quatro primeiros versos, e um único vocábulo no quinto verso; além de ter que ter um jogo de rimas: o segundo verso deverá rimar com o quinto e os demais versos no estilo de versos livres, isto é, sem obrigação de métrica e sem jogos de rimas”.

Quintas inaugurais de Andreia Donadon Leal

QUINTA1

infância adorada
ternas crianças
sobrinhos faceiros
ativam doces
lembranças!

QUINTA 2

azul celeste
sol aceso
flocos brumados
esmaecem pássaro:
indefeso!

Quintas inaugurais de J. B. Donadon-Leal

Terreno baldio
imponente abriga
matagal, insetos;
imóvel, consciência
intriga.

Solta pipa
Desenha destino
Descobre rumos
Inventa verdades
Menino.

Outros poetas publicam quintas

Boca tua
meu caminho
corpo curvas
meu pecado
desalinho

(Cláudia Pereira - Ouro Preto)

vida grandiosa
idade fugaz
presente canto
passarinho partiu:
jaz

(Iranildo Machado - Brasília)

botão aberto
revelada flor
corola orvalhada 
revelada providência: 
Amor!

(Janet Zimmermann - Mato Grosso do Sul)

o tempo
me espia
não passa
apenas atento...
desafia

(Celina Figueiredo - Itabira)

Tempo célere
humana ilusão.
Nós passamos,
os anos
não!

(Angela Fonseca, Belo Horizonte)

Sendo amante 
sonhar acordada
esperando talvez
breve abraço 
calada.

(Juçara Valverde - Rio de Janeiro)

de ti
minha boca
de mim
tua língua 
louca

(Alcides Ramos, Mariana) 

céu noturno
luar prateado
caleidoscópio estelar
cometas caminhantes
inebriado

(Tauã Lima Verdan - Espírito Santo)

na favela
grita fome
crianças choram
dor sem
nome!

(Maria da Glória Oliveira - Porto Alegre)

Feliz rio
De janeiro:
Enlevo idílico
O ano
inteiro

(Marcus Rodrigues - São Paulo)

ano novo
podo jardim
brota esperança
sempre-viva em
mim!

(Maria Beatriz Del Peloso Ramos, Rio de Janeiro)

Um poema desamarrado

Como se vê, a quinta é um poema desamarrado; cinco versos, nove palavras, um jogo de rimas e nenhuma outra obrigação. Letras iniciais liberadas, maiúsculas ou minúsculas, ao gosto do poeta. O que se requer, sem piedade, é que seja poesia. Para ser poesia, é preciso saber dizer sem ser óbvio, sem ser apenas informativo, tem que ser figurativo, desviante, provocante.

Que tal criar a sua quinta? Experimente; invente!

Saiba mais sobre a escritora

Andreia Donadon Leal é natural de Itabira, reside em Mariana há 17 anos. Possui graduação em Letras pela UFOP, Especialização em Artes Visuais: CULTURA E CRIAÇÃO, Mestrado em Literatura. Autora de 17 livros. Recebeu inúmeros prêmios nas áreas literária, cultural, social e educacional. É membro efetivo da Academia Marianense de Letras, da Aldrava Letras e Artes, da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, da ALACIB-BRASIL e do Pen Clube do Brasil. Venceu o Prêmio Nacional de Literatura - Cidade de Manaus e o Troféu Rio (UBE-2016 - Personalidade Cultural e Intelectual)

*Doutor em Linguística pela USP// Pós- Doutor em Análise do Discurso pela UFMG. Professor Emérito da UFOP.  Presidente do Conselho Editorial da Aldrava Letras e Artes.

Unidos também pela poesia: os poetas Andreia Donadon Leal e J.B Donadon Leal. Crédito-Reprodução/Facebook.

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