Antonio Marcelo Jackson F. da Silva Doutor em Ciência Política; professor da Universidade Federal de Ouro Preto Se existe um lugar-comum nas falas cotidianas sobre a política. Esse lugar-comum reside no argumento de que a educação é fator relevante e preponderante para a decisão quanto ao voto. E, verdade seja dita, isso não é de hoje. É possível identificar nos textos de Platão a defesa do “governo dos sábios”, onde Atenas seria administrada por um conjunto de filósofos em detrimento do restante da sociedade grega, assim como também, séculos depois, a república brasileira adotou ao longo de décadas a exigência da alfabetização como régua para saber se alguém poderia ou não participar da vida política do país. Em outras palavras, a afirmação de que quanto mais instruído melhor seria o cidadão é ponto pacífico nos diversos cenários vislumbrados. Porém, em meados da década de 1950, uma pesquisa realizada na cidade de Elmira nos Estados Unidos e posteriormente reproduzida em diversas outras localidades pelo mundo, constatou um elemento inusitado e que, para o bem e para o mal, exigiu todo um repensar sobre a práxis política: o eleitor, pouco importando sua instrução escolar, escolhia seus candidatos a partir dos mais variados critérios que necessariamente sequer tangenciavam o universo da política, ou seja, votava-se por motivações econômicas, por rejeição a um candidato, por sex appeal, porque eram amigos de infância, porque conhecia ou desconhecia o sujeito, por quase tudo; e, às vezes, até mesmo se votava por uma escolha ideológica (exceções à regra, conforme a pesquisa). A isso a Ciência Política deu o nome de “irracionalidade do voto”, pois, ao contrário de tudo aquilo que se pensara ao longo dos séculos, a escolha de um governante ou de um legislador não cobrava do eleitor um raciocínio vinculado às ideias políticas – muito pelo contrário. Nesse sentido, a participação na vida social de uma comunidade não estava vinculada a qualidade escolar de seus indivíduos, mais sim, a capacidade e compreensão de cada um em relação ao mundo público, às coisas que fossem comuns a todos e que, portanto, indicava que a cidadania até incorporava a educação nas escolas, mas a escolarização não era determinante para a cidadania em seu sentido político. Isto significa que a instrução formal é desnecessária? Evidentemente que não! Significa tão somente que um bom ou um mau eleitor não pode ser medido pela sua titulação acadêmica. Mas, perante a cidadania política, qual seria então o papel da escola? Inequivocadamente, a instrução formal contribui de maneira plena para a formação profissional, por exemplo, e que permite galgar melhoras na vida econômica e social de um indivíduo. Com isso, não há como negar, que ele pode adquirir mais bens de consumo e até mesmo consumir mais e melhores informações. Porém, não significa que sua capacidade de interpretar cenários seja superior que a de outras pessoas: significa apenas que apresenta maior sofisticação no conjunto de dados trabalhados e nos resultados que podemos esperar de seus comentários. E sofisticação não é sinônimo de superioridade. Frente a todo o exposto, podemos obter duas conclusões distintas. A primeira seria o entendimento de que se esse é o mundo em que vivemos então todas as opções devem ser consideradas por possuírem méritos; um exemplo: se temos um eleitor da classe mais abastada que faz sua escolha por considerar um determinado candidato porque este apresenta um projeto que beneficia seu estrato social e, de outro lado, outro eleitor de classe social mais baixa e que faz sua opção de voto por receber benefícios de programas assistenciais, os dois casos possuem motivação econômica e, por conseguinte, uma mesma lógica quanto ao ato de votar. O mesmo poderia ser aplicado a qualquer segmento e nos faz concluir que este é o “mundo real” e não podemos escapar dele. Contudo, aceitarmos essa primeira conclusão é acatarmos a morte de todas as ideologias e o chamado “fim da história”, pois passaríamos a viver num universo onde as escolhas seriam repetidas e rotineiras – o que nos cobra preço alto. A segunda conclusão seria entendermos este cenário como uma crise das ideologias e da política, mas que podem ser resgatadas em momento futuro. Para este caso, a cobrança residiria na reformulação dos conteúdos dos partidos e um repensar da classe política quanto às suas ações e posturas. A cobrança aqui residiria na exigência de que todas as pessoas – ou ao menos a maior parte delas – passassem a participar mais da vida pública via associações de moradores, sindicatos, sessões nas Câmaras de Vereadores e, se possível, também no Congresso Nacional. Sem dúvida que a rotina “da casa para o trabalho; do trabalho para a casa; passando vez por outra em um bar” seria drasticamente alterada. Participar da vida política dá trabalho! Por fim e com tudo isso, façamos nossas escolhas!
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