A dor era tão intensa que se tornara física. O peito ardia e os ombros doíam como se ela carregasse uma tonelada neles. Fora a cabeça que parecia explodir, resultado dos olhos inchados pelas lágrimas e noites insones. O coração despedaçado em mil pedaços deixava um vazio impossível de ser preenchido. Decidiu refugiar-se no sono. As pílulas no criado mudo na cabeceira da cama se tornaram sua salvação. Dormia e acordava, voltava a dormir e acordar. O mundo lá fora não existia mais. Não valia a pena. Um dia abriu os olhos. Não sabia se era dia ou noite. Arrastou-se da cama até a janela e abriu-a. Os raios do sol bateram em seu rosto causando enorme mal estar. Fechou-a novamente. Há quanto tempo estava ali? Três dias? Quatro? Uma semana? Perdera a noção do tempo. No criado mudo as pílulas que, nos momentos de desespero, a atiravam na fuga do sono, começavam a diminuir. Dormir, dormir e dormir era a sua solução. Fuga temporária, mas única saída que encontrava para o seu sofrimento. Dormia e acordava, acordava e dormia. Estava no décimo segundo andar de um prédio no meio de uma das maiores avenidas da cidade, mas o barulho lá em baixo não a incomodava mais. Em uma tentativa inglória de voltar para a vida, tateou na cama o controle remoto e ligou a televisão. Manifestações, crimes, tragédias tão maiores do que a sua lhe passaram pelos olhos. Seu país estava desmoronando com problemas tão mais sérios, mas isso não diminuía a sua dor. Desligou a televisão e buscou outra pílula. Mais doze horas de sono para fugir deste mundo onde ela não cabia mais. E assim continuou, entre o acordar e o despertar, cada vez mais fraca e alheia à vida. Aquele dia foi diferente. Acordou e ao pegar o frasco viu que ele estava vazio. Nem fugir ela podia mais. Bateu o vidro de remédios nas mãos espalmadas, na esperança de encontrar pelo menos uma, mas haviam acabado. Não tinha idéia de quantas tinha tomado, não percebeu que estavam no fim. Tentou voltar a dormir. Não conseguiu. O corpo todo doía, embora não tivesse nenhuma doença clínica. Procurou descansar, mas o sono não vinha. Ela queria, ela precisava dormir. Caminhou novamente até a janela. Descobriu que era dia, pois a luz do sol novamente cegou-a. Desta vez não fechou a janela. Esperou um pouco até os olhos se acostumarem e caminhou até o parapeito. Pela primeira vez, ela não saberia precisar a quanto tempo, ouviu novamente o barulho da avenida e presenciou a claridade do dia. Com um sorriso nos lábios, abriu os braços e mergulhou no sol, para a fuga do sono eterno. Finalmente, estava em paz.
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