“Não se politiza uma doença”, escreve Valdete Braga em sua coluna para o Jornal Voz Ativa

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Por Valdete Braga Publicado em 27/04/2020, 10:08 - Atualizado em 22/02/2021, 15:27
Foto – A escritora Valdete Braga. Crédito – Reprodução. Siga no Google News

Recebi dois convites para festas neste feriado. Desde que começou a quarentena – pasmem – é o quarto convite que recebo para alguma festa ou reunião. Difícil de acreditar, mas nem me admira mais. Muita gente não está levando a sério o que está acontecendo. Pior: muitos estão politizando uma doença.

Concordo que não devemos espalhar pânico, óbvio que não, até porque muitos precisam sair, trabalhar, cumprir algum compromisso inadiável. Mas festa? “Reunião só com os mais chegados?” Isto não existe, estamos vivendo um momento de atenção mundial, onde a irresponsabilidade de um pode levar vários à morte. Não é exagero, não é terrorismo, é a realidade gritando em nossa porta.

Argumentei com a pessoa, aliás, pessoa por quem nutro grande estima, e a resposta foi pior do que o convite. “Mas vamos ficar trancados em casa o resto da vida?” Não, claro que não. Mas quanto mais uns abusarem, repito, sem necessidade, mais tempo os que não abusam terão de ficar. Não “trancados dentro de casa”, mas cumprindo um isolamento social necessário, no momento.

Aí, quando tentamos argumentar, surge aquela frase que virou jargão na boca dos que são contra a quarentena: “se não morrer pelo vírus, morre de fome”. O irônico é que os que usam esta fala decorada nunca passaram fome na vida. Dificuldade, todos nós estamos passando, ou já passamos, em algum momento. Mas passar dificuldades, lutar a cada dia pela sobrevivência, é uma coisa, passar fome é outra.

Não consigo nem imaginar a dor de um pai ou mãe que vê um filho ir dormir reclamando de dor de barriga por não ter se alimentado o dia inteiro, e isso por dias seguidos. Isto é passar fome, e isto os que se acham especialistas em economia, que repetem frase de efeito, nunca sentiram na própria pele. Eu também nunca senti, graças a Deus, o que não me impede de me solidarizar e fazer o que posso, sem alardes e sem postagens em redes sociais, para ajudar quem passa por isto.

Não se politiza algo tão sério. É desumano alguém se dizer “contra” ou “a favor” do isolamento social, de acordo com o que o seu político de estimação determinar. Estamos falando de saúde, e saúde mundial. Ninguém, em sã consciência, se coloca em posição favorável ou contrária à saúde, e o isolamento é pela saúde, não é pelo posicionamento político, pelo amor de Deus!

Fazer e frequentar uma festa porque “se não morrer pelo vírus, morre de fome” é de uma incoerência incalculável. Quem corre o risco de morrer de fome não dá festas. Quarentena não são férias. Dói ver o nível de desumanidade de algumas pessoas, o egoísmo que não dá nem para ser chamado de ignorância ou falta de informação.

Este meu amigo não é uma pessoa ruim, pelo contrário. Mas, como muitos, embarcou na canoa da politização. Só assiste, lê ou ouve a fonte que lhe interessa. Não procura ouvir o outro lado, não se informa além das fontes pré escolhidas. Muitos fazem isto, de ambos os lados. Em lugar de procurar ouvir embasamentos técnicos, buscar informações de quem pode fornecer dados específicos, ficam ouvindo “fulano disse”, beltrano falou” e se tornam massa de manobra em uma questão tão séria.

Quer sair? Dar festas? Frequentar praias? Lembre-se de que se você não dá valor à própria vida, outros dão à deles. E o mais injusto nisto tudo é que você pode sair desta história lépido e fagueiro, mais saudável do que nunca, e infectar alguém que não tem nada com isto.

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