Por Valdete Braga Dois rapazes, pouco mais do que crianças, conversavam no ponto do ônibus, em uma linguagem só deles, tão peculiar, que não dava para saber se era conversa, brincadeira, ou briga. “Porra mano” prá cá, “viado” prá lá, fdp (para não dizer as palavras completas) acolá... Peço desculpas aos leitores pelas palavras de baixo calão, mas elas são necessárias para dar sentido ao verdadeiro objetivo da crônica. Junto às desculpas peço um pouco de paciência que já chego lá. O jeito deles também não dava para saber se era brincadeira ou briga. Um empurrava o outro, que logo voltava e devolvia o empurrão e ao mesmo tempo em que se empurraram e se xingavam, riam. As pessoas se afastavam (inclusive eu) em uma atitude que os poticamente corretos com certeza chamariam de preconceito, mas eu chamo de prudência. Assim como todas as demais pessoas que estavam no ponto de ônibus, incluindo uma senhora com uma criança no colo. Em um determinado momento, um dos rapazes elevou bastante a voz e disse para o outro: “espere aí que eu vou lá em casa buscar meu revólver prá gente conversar direito”. O outro respondeu: “pode ir, pensa que eu tenho medo de você, véi”? O primeiro saiu correndo pelo asfalto, ante os olhares estupefatos de todos nós. Se foi buscar revólver mesmo ou era um blefe, nunca saberemos. Logo o outro rapaz foi embora também. Os ônibus foram chegando, cada passageiro subindo no do seu itinerário, mas aquelas palavras do garoto e a imagem dele correndo pelo asfalto não saíam da minha cabeça. Teria ele realmente ido buscar um revólver para ameaçar o “amigo”? Pior: teria ele um revólver em casa? Carinha de menino, quatorze, quinze anos. Não que se fosse adulto justificasse, mas um adolescente fica mais triste ainda. Que mundo é este? Que tipo de relação é esta entre as pessoas, em que uma discussão banal é motivo de um ir buscar revólver e o outro ainda enfrentar “pode buscar que não tenho medo”? Arma de fogo nas mãos de adolescentes virou coisa normal. Não sei como terminou a história e graças a Deus que não sei. Particularmente, não acredito que ele tenha voltado, mas duvidar também não duvido. Do jeito que as coisas andam... também não posso afirmar que este revólver exista, como também não é de se duvidar. Violência banalizada entre adultos é assustador, entre adolescentes é muito mais. Um menino de quatorze, quinze, anos que, tendo ou não arma de fogo em casa ameaça outro, o que fará aos vinte? Aos trinta? E, por mais triste que seja esta constatação, chegará ele aos trinta? Situações que presenciamos no nosso dia a dia, com a qual nos deparamos a cada minuto, e que nos deixam a cada dia mais assustados e impotentes, com a pergunta sem resposta em nossos corações: o que fazer?
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