“A forasteira e o ouro-pretano, um amor de Natal”, por Roberto dos Santos

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Por Roberto dos Santos Publicado em 30/11/2021, 15:01 - Atualizado em 30/11/2021, 15:01

Eleonora foi a Ouro Preto para conhecer a cidade e realizar um sonho antigo, gestado em consequência das imagens vistas pela televisão e documentários produzidos por diversos veículos de comunicação. Queria passear pelas ruas de Ouro Preto numa noite de chuva fina. Tinha nítido em sua mente a imagem e o efeito provocado pela chuva quando em contato com as pedras centenárias das calçadas ouropretanas.

Depois de pesquisar a previsão do tempo e saber que poderia ter chuva em Ouro Preto no dia 24 de dezembro, o ano era 2013, programou-se para estar lá nessa data.

No dia 22 de dezembro desembarcou na cidade. Era uma noite linda com lua e um imenso azul cravejado de estrelas brilhantes. Embora a noite estivesse linda, não era o cenário que esperava encontrar. Onde estava a chuva que a meteorologia havia previsto? Naquele momento perguntava no seu íntimo se a chuva viria mesmo na noite de Natal.

Descansou, passeou, conheceu as maravilhas da cidade monumento mundial, até que a véspera de natal chegou e as primeiras horas desse dia apresentavam o mesmo cenário dos dias anteriores. Eleonora temia pela não realização do seu sonho.

Às 07:00 horas da manhã ainda na véspera de natal, abriu a porta da pousada olhou para ver se o cenário havia se alterado. Percebeu ao longe uma cortina branca envolvendo o pico Itacolomy seguindo por todas as elevações que abraçavam a cidade. O céu estava nublado. Um sorriso alargou-se em seus lábios delicados e a esperança voltou a inebria-la.

Tomou então seu café da manhã e saiu para mergulhar na história. Programou conhecer algumas igrejas, museus e sentar-se na Praça Tiradentes para ver o movimento. Feito isso, como último ato, deslocou-se para a igreja de Nossa das Mercês e Misericórdia, aquela que fica as portas da Praça Tiradentes na visão de quem já passara pelo bairro São Cristóvão e rodoviária.

Lá fotografou os telhados coloniais magníficos e depois foi almoçar. Descansou a tarde toda, programou seu celular para acorda-la às 20:00 horas. No horário programado o celular despertou. Ela então foi até a janela e abrindo-a avistou algo inesperado. A cidade estava envolta num branco total, uma chuva fina e um vento frio era o que se via e sentia naquela hora.

Eleonora agasalhou-se e saiu para caminhar na chuva. Começava ali a realização do seu sonho. A cada passo nas calçadas molhadas e escorregadias, ela se extasiava. Faltavam poucas horas para o Natal, mas ela nem estava lembrando-se disso.

A Rua São José, tão bela rua, foi fotografada por ela, e nas fotos os registros do tão sonhado espetáculo. Nas paredes dos casarões antigos, as luminárias rústicas emitiam luzes que iam de encontro à tricentenária calçada que já molhada pela chuva proporcionava um espetáculo de raríssima beleza. Ela não economizou clicks.

Alguns minutos depois seguiu sua caminhada calma e tranquila. A noite era toda dela.

Chegando ao largo do Rosário encantou-se mais uma vez. De novo começou a clicar e fazer fotos inesquecíveis da ladeira molhada e brilhante.

Subitamente uma mão tocou-lhe os ombros desejando feliz Natal. Eleonora virou-se rapidamente e seu olhar encontrou outro olhar, e nessa troca de olhares ela conheceu Eliézer. Na sequência tentou explicar seu sonho e o motivo de estar ali. Depois de tentar se explicar o indagou sobre o motivo da presença dele ali.

Eliézer disse que sentiu vontade caminhar pela rua, de fotografar a cidade e saiu sem destino, apenas deixou se levar.

Naquela hora um clima diferente já se estabelecia entre a forasteira e o ouro-pretano.

No embalo do momento Eliézer sugere a Eleonora caminharem juntos rumo a Basílica de Nossa Senhora do Pilar, e assim o fizeram. Passaram pelo “paço” que fica no começo da Rua Antônio Albuquerque, seguiram pela mesma rua até chegar à capela do Bomfim, depois enveredaram pela Travessa Lauro Barbosa e alguns passos a frente já avistaram a majestosa Basílica.

À noite já quase madrugada de Natal estava fria e chovia mansamente. Apenas Eleonora e Eliézer caminhavam nas imediações da Basílica do Pilar. As vozes que se ouviam vinham de lugares mais distantes. Para se protegerem da chuva fina se abrigaram na porta da Basílica, e aproveitaram para conversar.

O rapaz vendo que fazia frio e que esse frio a incomodava, tirou seu casaco e colocou sobre os ombros da moça. Ela sorriu em agradecimento. Pouco depois Eleonora vendo que Eliézer estava desprotegido, por lhe oferecer o casaco, com a leveza de uma pluma deslocou lateralmente aconchegando-se nos braços do seu parceiro de caminhada.

Ele sentiu a quentura corporal de Eleonora e sem palavra alguma e num profundo silêncio permitiu que ela o aquecesse. O abraço no qual estavam envoltos significava uma porção do paraíso.

A respiração ofegante de Eleonora foi sentida nos inquietantes suspiros e na profunda respiração quando o ar insistia numa descontinuidade. Já o coração de Eliézer batia numa intensidade tamanha que Eleonora sentia todo o seu pulsar. O que estava acontecendo com aqueles dois não tinha explicação, algo que surgiu do nada.

Uma árvore de natal confeccionada bem em frente da Basílica do Pilar começou a piscar com mais intensidade. A calçada molhada reproduzia todo esse espetáculo de pura beleza.

De repente Eliézer sentiu em seu ombro - lugar que a cabeça de Eleonora repousava – algo parecido com um pingo de chuva, porém esse pingo estava quente.

Ele delicadamente afastou o rosto dela e viu seus olhos brilhantes imersos em lágrimas. Ela sorriu um pouco desconcertada e foi afagada por ele que apertou um pouco mais o abraço e em silêncio aproveitaram aquele momento mágico e indescritível.

O silêncio só foi rompido no momento em que Eliézer perguntou quando a moça pretendia ir embora. Quando ela mencionou que seria no final do dia de Natal, o rapaz inquietou-se, porém não esboçou nenhuma reação abrupta. Mas o que fez a seguir foi algo de surpreendente. Em movimentos minimamente calculados e suaves, ele a afastou um pouco, segurou o seu queixo, o elevou alguns graus ao ponto dos olhares se encontrarem. Ficaram alguns segundos inertes, um olhando para outro. Uma lágrima percorreu todo seu rosto e foi ao chão, Eleonora também não conseguiu conter-se e uma lágrima também percorreu seu rosto por inteiro parecendo querer encontrar aquela que Eliézer não conseguiu segurar. O diálogo transcorria apenas pelo olhar.

Eleonora num ato contínuo a todas essas manifestações fechou os olhos e num segundo sentiu os lábios de Eliézer tocarem os seus. Naquele momento os sinos da Basílica tocaram duas vezes, a árvore de natal bem na frente da Basílica parou de piscar, o tempo pareceu parar, uma música em tons suaves passou a ecoar bem próximo deles. Parecia alguém ao piano dando tons aquela história de amor.

Após esse intenso momento, Eliézer disse a Eleonora que não entendia o que estava acontecendo, tudo aconteceu tão rápido. Ela também sem saber explicar os acontecimentos confidenciou que não queria mais deixa-lo.

Em meio e envolto por esse mútuo querer, se entregaram ao inexplicável, se abraçaram e curtiram o mágico momento.

Eleonora lembrou Eliézer do adiantar da hora e disse que precisava voltar para a pousada, ele então se prontificou a leva-la. Mas antes de iniciar essa caminhada, fotografou os dois refletidos na calçada molhada do Pilar. Depois seguiram em direção à rua da escadinha para acessarem a Rua São José.

Ainda nos primeiros degraus da escada, sem muitas palavras ele a surpreendeu com um pedido de namoro. Ela sem pensar aceitou de imediato, afinal seu coração já esperava por isso, ainda que houvesse uma pontinha de receio de que tudo terminasse quando chegassem à pousada.

Mas como tudo caminhava bem, terminaram a subida da rua da escadinha e avançaram pela Rua São José até a pousada onde ela estava hospedada.

Chegando lá se despediram e marcaram novo encontro pela manhã.

Aquela madrugada ainda não havia terminado, tanto Eleonora quanto Eliézer não conseguiram dormir. Ficaram pensando que loucura fora aquela que acabara de acontecer!

Eleonora pensava: Será que foi a magia do Natal de Ouro Preto? Será que a chuva de Natal é uma chuva de sonhos?

Eliézer pensava: Será que o impulso de sair para caminhar na véspera de natal, teria sido obra do espirito natalino a povoar os ares ouro-pretano?

O fato é que o natal não é uma data simples, ou um dia a mais no calendário. Ele traz não apenas amores, mas esperança e uma gama de outros sentimentos nobres.

Eleonora e Eliézer tiveram muitos outros Natais juntos. Faziam em toda noite de Natal nos anos que seguiram o caminho que os colocaram frente a frente. A única diferença foi que depois de alguns anos esse ritual passou a ser cumprido a três. Maria Elisa passou a incorporar esse cenário de sonhos sendo ela fruto desse amor de Natal.

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