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Exposição “A viagem da redescoberta: os modernistas nas cidades históricas de Minas”

Exposição celebra os 100 anos (1924-2024) da visita dos modernistas às cidades históricas de Minas.

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Por JornalVozAtiva.com Publicado em 15/03/2024, 15:30 - Atualizado em 15/03/2024, 15:30
Clan do jabuti (1927) Siga no Google News

De 21 a 31 de março ocorrerá em Ouro Preto a exposição A viagem da redescoberta: os modernistas nas cidades históricas de Minas, celebrando os 100 anos (1924-2024) da visita dos modernistas às cidades históricas de Minas.

Na Semana Santa de 1924, após passar por Belo Horizonte, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, o poeta francês Blaise Cendrars, entre outros, decidem conhecer as cidades históricas de Minas, principalmente Ouro Preto. Foi uma redescoberta do Brasil, em termos históricos e estéticos. Era a inspiração que faltava para toda a produção artística que viria a seguir, em livros e pinturas. Era como se o Movimento Modernista esperasse por um Brasil genuíno, profundo, original para concretizar suas propostas.

A exposição será realizada pelo Instituto Peck Pinheiro, na Casa de Gonzaga, e trará 18 livros e revistas originais, em primeira edição, relacionados aos ilustres visitantes de 1924. Estarão lá, entre outros, as primeiras edições de Paulicéia desvairada, MacunaímaClã do Jabuti, Pau-Brasil, Primeiro caderno do aluno de poesia Oswald de AndradeFeuille de Route, de Cendrars, além de exemplares das revistas modernistas Klaxon e da Verde, do grupo modernista de Cataguases. Diversos com ilustrações de Tarsila e outros autografados.

O Instituto Peck Pinheiro foi criado para incentivar o amor à leitura e à preservação de grandes obras de nossa literatura. Irá criar e gerir o Museu da Literatura Brasileira em Ouro Preto, em 2025, um museu inédito no Brasil.

O Instituto Peck Pinheiro pertence aos bibliófilos Romulo Pinheiro e Patrícia Peck Pinheiro, e sua biblioteca fica atualmente em São Paulo, aguardando a abertura do Museu em Ouro Preto.

Veja algumas obras que estarão em exposição:

Paulicéia desvairada (1922)
Clan do jabuti (1927)
O Aleijadinho e Álvares de Azevedo (1935)
Manifesto antropófago (1924)

Pau-Brasil (1925)
Feuilles de route (1924)

Mais informações sobre o projeto para criação do Museu da Literatura Brasileira em Ouro Preto pelo Instituto Peck Pinheiro, podem ser acessadas aqui.

Mário de Andrade, modernista mineiro

Por André Botelho

Para Angelo Oswado de Araújo Santos, em agradecimento 

Mário de Andrade conheceu Minas Gerais em 1919. Difícil dissociar do então católico praticante o interesse que desenvolve pioneiramente, entre os modernistas, pelo barroco mineiro, que viria a ser objeto de contemplação na viagem do grupo em 1924 e, posteriormente, de políticas públicas de patrimonialização, por ele orientadas. Foi assim, em sua primeira viagem a Minas, para uma conferência na Congregação da Imaculada Conceição da Igreja de Santa Efigênia, quando, sob grande impacto, entra em contato pessoalmente com a obra de Antônio Francisco Lisboa, mais conhecido como Aleijadinho, o que o leva a escrever, ao longo de anos, o ensaio “O Aleijadinho”, publicado somente em 1935; como também o artigo “A arte religiosa no Brasil: em Minas Gerais” publicado na Revista do Brasil, em 1920, que dá continuidade a outros dois artigos publicados na mesma revista em números anteriores do mesmo ano, “A arte religiosa no Brasil: triumpho eucharístico de 1733” e “A arte religiosa no Rio”.

Assim, quando chegam em 1924 a Minas Gerais, a redescoberta modernista coletiva do Barroco já estava em parte informada, e bem formada, por Mário. Durante a Semana Santa de 1924, com o propósito de mostrar o Brasil ao poeta franco-suíço Blaise Cendrars, artistas modernistas paulistas e seus mecenas, como Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade e seu filho Nonê, Paulo Prado, Dona Olívia Guedes Penteado, René Thiollier e Gofredo da Silva Telles redescobrem eles mesmos o Brasil a partir do Barroco. Mário pôde percorrer a Minas Gerais da tradição, deliciando-se com as cidadezinhas, as histórias, a música, a imaginária religiosa. A descoberta fundamental, porém, era que se o primitivismo estético, então valorizado pelas vanguardas da Europa, no nosso caso encontrava-se não em lugares distantes e exóticos, mas em nossa sensibilidade. Essa descoberta será decisiva em vários sentidos e também a conquista e o legado mais duradouros do modernismo para a cultura brasileira. Não apenas o reconhecimento da pluralidade das manifestações artísticas do povo brasileiro, mas a proposta de diálogo entre elas, com lugares de fala e lugares de escuta. Ainda hoje um desafio para a sociedade brasileira como um todo. Para o papel de Mário no modernismo mineiro, vejam meu livro e de Maurício Hoelz, O modernismo como movimento cultural (Vozes, 2022) e as publicações sobre ele na BVPS (clique aquiaqui aqui). E também a mesa do MinasMundo: Mario de Andrade, modernista mineiro.

Assim, gostaria de destacar, na valiosa coleção Peck Pinheiro, o exemplar do Clã do Jabuti (1927), de Mário de Andrade, onde vejo as consequências mais consistentes em termos de estética e de política da viagem modernista de 1924. Se a Paulicéia desvairada (1922), o primeiro livro modernista de Mário, coube, em grande medida, difundir os princípios estéticos das vanguardas europeias e também sistematizar o uso do verso livre no Brasil, em Clã do Jabuti (1927), esse processo é aperfeiçoado. A meditação sobre o Brasil explora as tensões entre litoral europeizado e sertão rústico e as associações entre manifestações de cultura popular e a prática literária erudita. Assim, o verso livre, que se tornara o principal instrumento de reação modernista à hegemonia parnasiana, se aproxima definitivamente do cotidiano e das coisas comuns e simples da vida, e assume o papel de instrumento de pesquisa e conhecimento do Brasil. Tudo isso é redimensionado em Remate de males (1930), onde o afastamento dos embates modernistas mais imediatos permitiu a poesia de Mário ficar mais subjetiva e de um lirismo amoroso que mistura a paisagem com estados afetivos.

A viagem a Minas Gerais de 1924 terá efeitos profundos também na pintura de Tarsila do Amaral e na poesia de Oswald e Andrade. Mas, permanecendo com Mário, fechemos esse rápido comentário com um exemplo tomado ao Clã. Leiamos “Toada do Pai-do-mato”, um dos poemas que formam “O ritmo sincopado” dedicado a Tarsila, e que mostram a recriação poética de Mário de uma lenda dos índios Parecis na forma de uma toada, designação atribuída a uma cantiga de melodia simples e monótona:

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