Indicadores sociais das mulheres: Estudo do IBGE revela manutenção das desigualdades estruturais em Minas Gerais
Mulheres pretas ou pardas gastam mais tempo em tarefas domésticas, participam menos do mercado de trabalho e são mais afetadas pela pobreza.
Hoje (8/3) celebramos o Dia da Mulher. Para algumas pessoas, é dia de comemoração; para outras, esta data representa um momento para reflexão e luta. Para todas e todos, enquanto sociedade, o IBGE apresenta a terceira edição das Estatísticas de gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil. Publicado de três em três anos, o objetivo do estudo é trazer uma sistematização de informações fundamentais à análise das condições de vida das mulheres no país.
Neste informativo, serão abordados os dados para Minas Gerais quanto aos seguintes temas: educação; empoderamento econômico; saúde e serviços relacionados; vida pública e tomada de decisão; e direitos humanos das mulheres e meninas1. Os dados foram desagregados por sexo2 e, sempre que possível, por outras características de forma a revelar iniquidades, em consonância com os estudos mais atuais sobre interseccionalidades – que indicam que a cor ou raça, ser pessoa com deficiência, morar em áreas urbanas ou rurais, entre outros, podem, quando combinados, causar impactos significativos sobre a vida das pessoas, reforçando e ampliando as desigualdades.
Educação e empoderamento econômico
- Em Minas Gerais, mulheres são maioria nos matriculados e concluintes, mas minoria entre os docentes de ensino superior;
- Mulheres sem presença de crianças de até 6 anos no domicílio estavam mais ocupadas no mercado de trabalho do que mulheres com crianças em casa; cenário oposto ocorre com os homens;
- Mulheres se dedicaram aos afazeres domésticos mais que o dobro de tempo em relação aos homens; entre as pessoas ocupadas, desigualdade se mantém.
Um relevante indicador produzido pelo IBGE quando se fala em educação e trabalho é a proporção de pessoas de 15 a 24 anos que não estudam, não estão ocupadas nem em treinamento3. Esse dado é investigado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua). Observa-se que, no ano de 2022, em Minas Gerais, 20,7% das mulheres e 11,9% dos homens nesse grupo etário se encontravam em situação de desocupação e ausência de atividades escolares, de preparação ou qualificação (gráfico 1). Esta é a menor proporção registrada para ambos os sexos nos cinco anos de levantamento do dado, mas a diferença entre sexos atingiu o pico no estado, em termos proporcionais: o percentual das mulheres de 15 a 24 anos que não estudavam, não trabalhavam nem estavam em treinamento em 2022 foi 74,1% maior que o de homens na mesma situação em Minas Gerais.

Embora as mulheres apresentem maiores taxas de matrícula no ensino superior (32,6% em 2022, ante 28,1% dos homens, em âmbito nacional) e proporções de pessoas com ensino superior completo na população com 25 anos ou mais (21,3%, enquanto 16,8% dos homens têm esse nível de escolaridade) e representem 60,3% dos estudantes concluintes em curso de graduação presencial no Brasil4, elas são minoria entre os professores (em exercício e afastados) de ensino superior: 47,3%, ainda em 2022 e em nível nacional. Em Minas Gerais, a proporção de docentes de ensino superior do sexo feminino era de 45,8% em 2022 – maior resultado do estado na série histórica iniciada em 2012, mas 1,5 ponto percentual (p.p.) abaixo do valor apurado nacionalmente (tabela 1) e quinto menor resultado entre as unidades da federação.

No que diz respeito ao mercado de trabalho de maneira mais ampla, dois indicadores revelam disparidades entre homens e mulheres: a taxa de desocupação e o nível de ocupação de pessoas de 25 a 54 anos de idade por presença de criança de até 6 anos no domicílio. De 2012 a 2022, as oscilações na desocupação atingiram de maneira mais intensa as mulheres pretas ou pardas. Entre os quatro grupos aqui destacados, o de homens brancos foi o menos vulnerável a variações, como se observa no gráfico 2. Entre os dois extremos, homens pretos ou pardos e mulheres brancas trocaram de posição algumas vezes ao longo da série histórica para Minas Gerais. Em 2022, temos o seguinte cenário: 6,7% de desocupação na média masculina, sendo 4,5% entre os homens brancos e 8,2% no grupo de homens pretos; e taxa de desocupação de 9,1% entre as mulheres, sendo que 6,4% das mulheres brancas e 10,9% das pretas ou pardas de 14 anos ou mais estavam desocupadas em 2022.

A presença de crianças em um domicílio pode indicar a necessidade de adequações na rotina e nas atividades laborais. Que grupo é mais impactado em sua vida profissional? Para mensurar esse indicador, o IBGE investiga, na PNAD Contínua, o nível de ocupação de pessoas de 25 a 54 anos por presença de criança de até 6 anos no domicílio. De modo geral, observa-se que a presença de crianças está associada ao crescimento dos níveis de ocupação dos homens e à redução dos níveis de ocupação entre as mulheres. Essa tendência se observa ao longo de toda a série histórica para Minas Gerais (tabela 2), mas a diferença entre os níveis de ocupação dos grupos com crianças e sem crianças atingiu o ponto mais alto em 2022: enquanto as mulheres sem crianças apresentavam nível de ocupação 17,1% menor que o dos homens na mesma situação, as mulheres com crianças no domicílio tinham nível de ocupação 37,8% menor que o dos homens com crianças de até 6 anos em 2022, em Minas Gerais.

Com o tema Trabalho de cuidado realizado pela mulher, a prova de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) 2023 gerou ampla repercussão e trouxe dados do IBGE. Para além do estudo e do trabalho remunerado, a PNAD Contínua investiga o número médio de horas que as pessoas dedicam aos cuidados de pessoas e/ou afazeres domésticos. Em 2022, podemos observar a persistência de disparidades tanto entre homens e mulheres quanto entre mulheres brancas e pretas ou pardas, no que se refere ao tempo dedicado a esses afazeres em Minas Gerais. Enquanto homens brancos empregavam uma média de 11,3 horas nos afazeres domésticos e/ou cuidados de pessoas, as mulheres pretas ou pardas dedicavam, em média, 23,1 horas a essas atividades. Os demais dados para o estado, referentes a esse indicador ao longo dos anos investigados, estão na tabela 3.

Quando se observa a dedicação aos cuidados de pessoas e ou afazeres domésticos por grupos de idade, nota-se que as maiores desigualdades entre as horas empregadas por homens e por mulheres aparecem no grupo de 30 a 49 anos: em 2022, os homens desse grupo etário dedicavam, em média, 11,6 horas a essas atividades, ao passo que as mulheres investiam mais que o dobro (média de 24,3 horas) nessas modalidades de tarefas em Minas Gerais. Apesar de haver variações nas médias ao longo dos anos (tabela 4), a tendência se mantém entre os diferentes grupos de idade: as mulheres dispendem, em média, cerca do dobro do tempo que os homens dedicam às atividades de cuidados de pessoas e/ou afazeres domésticos. É interessante destacar que as disparidades entre homens e mulheres detectadas neste indicador se repetem – embora de maneira um pouco menos acentuada – entre as pessoas ocupadas.

Saúde e serviços relacionados
Mortalidade materna retorna a cenário de estabilidade, após crescimento na pandemia
Os seguintes indicadores serão apresentados na temática de saúde e serviços relacionados: razão de mortalidade materna; taxa de mortalidade em menores de cinco anos por sexo; e taxa de mortalidade das pessoas de 30 a 69 anos de idade por doenças cardiovasculares, câncer, diabetes ou doenças respiratórias crônicas por sexo.
De 2009 a 2019, a razão de mortalidade materna se mantinha em patamares estáveis, tanto no Brasil quanto em Minas Gerais. Já em 2020 (primeiro ano da pandemia de Covid-19), houve um crescimento neste indicador – de maneira bem mais acentuada nacionalmente do que no estado: em 2019, foram 57,9 mães mortas a cada 100.000 nascidos vivos no Brasil e 44,4 a cada 100.000 nascidos vivos em Minas Gerais, enquanto, em 2020, esses números foram 74,7 e 51,0, respectivamente. Mas o crescimento mais intenso ocorreu no ano seguinte: em 2021, para cada 100.000 nascidos vivos, foram registradas 117,4 mortes de mães no Brasil e 94,6 em Minas Gerais. Por sua vez, no ano de 2022, os patamares do indicador retomaram níveis pré-pandêmicos: 57,7 mães mortas a cada 100.000 nascidos vivos no Brasil e 46,8 em Minas Gerais (tabela 5).

Quando se avalia as taxas de mortalidade em menores que cinco anos por sexo, de 2013 a 2021, constata-se a persistência de valores menores entre as pessoas do sexo feminino. Em 2021, ano mais recente da série, registrou-se uma taxa de mortalidade de 11,1 meninas por 1.000 nascidas vivas em Minas Gerais, enquanto essa taxa foi de 14,9 para cada 1.000 meninos nascidos vivos. De modo geral, as taxas em Minas Gerais ficam abaixo da média nacional, como se observa na tabela 6.

De maneira geral, observa-se maior tendência de cuidados com a própria saúde, ao longo da vida, por parte das mulheres. Isso se reflete na taxa de mortalidade das pessoas de 30 a 69 anos por doenlas cardiovasculares, câncer, diabetes ou doenças respiratórias crônicas, tanto para Minas Gerais quanto para o Brasil. Apesar da queda de 1,4 p.p. na proporção de mortes de homens por essas doenças de 2013 a 2022 em Minas, a distância da taxa masculina para a feminina permanece, ao longo dos anos, na casa dos cinco pontos percentuais (gráfico 3).

Vida pública e tomada de decisão
Apesar de serem maioria na população, mulheres representavam somente 7,2% dos prefeitos em 2020 e apenas 17,0% da bancada mineira na Câmara dos Deputados em 2023.
Há iniciativas e tem ganhado espaço no debate público, sobretudo ao longo dos últimos anos, em busca da maior representatividade feminina em cargos eletivos e posições de destaque na vida pública. Mas as tentativas até então postas em prática tem se mostrado insuficientes para a redução das disparidades entre os quantitativos de homens e de mulheres em espaços de poder. Nesta seção, serão apresentados os seguintes indicadores: proporção de mulheres entre os candidatos para a Câmara dos Deputados; proporção de mulheres eleitas para prefeituras; proporção de mulheres entre os parlamentares eleitos para as câmaras de vereadores; proporção de cadeiras ocupadas por mulheres em exercício na Câmara dos Deputados; participação das mulheres nos cargos gerenciais; e rendimento médio das pessoas em cargos gerenciais por sexo.
Em 2014, a proporção de candidatas ao cargo de deputada federal era de 31,8% no Brasil e 31,4% em Minas. Esses percentuais foram para 32,1% (Brasil) e 31,6% (Minas Gerais) em 2018; e, por fim, alcançaram 35,0% no Brasil e 33,4% em Minas Gerais no ano de 2022. Ao observar o recorte racial em âmbito nacional, tem-se maior proporção de mulheres indígenas (45,8%) e pretas (44,5%) entre as candidatas.
Porém, quando falamos das mulheres eleitas e ocupantes de cadeiras na Câmara dos Deputados, o cenário é bastante distinto: em 2017, apenas 9,4% dos parlamentares em exercício eram mulheres – o que corresponde a 5 dos 53 deputados da bancada mineira. Na legislatura seguinte (em 2020), havia somente 4 mulheres (7,5%) entre os 53 deputados federais mineiros; nesse ano, a proporção de deputadas mineiras representava apenas metade da proporção nacional (14,8% ou 76 dos 513 deputados federais). Por fim, em 2023, 9 (ou 17,0%) dos 53 deputados federais da bancada mineira eram do sexo feminino, o que reaproximou a proporção de mulheres eleitas na bancada mineira da proporção nacional (17,9%).
Em 2016, 7,5% dos prefeitos eleitos em Minas Gerais eram mulheres; nacionalmente, a proporção era de 11,5%; já em 2020, as proporções para o estado e o país caminharam em rumos opostos: enquanto o percentual de prefeitas eleitas passou a 12,1% em âmbito nacional, ele recuou para 7,2% nos municípios mineiros. Nas câmaras municipais, o cenário se mostrou um pouco diferente: a proporção de vereadoras eleitas em Minas Gerais foi de 10,8% em 2016 para 14,0% na legislatura seguinte, ao passo que, no Brasil, as proporções de vereadoras eleitas foram de 13,5% em 2016 e de 16,1% em 2020. De qualquer maneira, considerando que o Censo 2022 encontrou 51,24% de mulheres em Minas Gerais e 51,48% no Brasil, a sub-representação feminina, sobretudo entre os parlamentares eleitos em diferentes âmbitos, é digna de nota.
A participação das mulheres nos cargos gerenciais é levantada pela PNAD Contínua. Observa-se que, de 2012 a 2022, ocorreram oscilações na participação feminina em Minas Gerais, enquanto, nacionalmente, as proporções apresentaram mais estabilidade (tabela 7). A participação das mulheres nesses cargos fica em torno de um terço, tendo atingido seu ponto mais alto no estado em 2018 (43,4%). Em 2022, 36,6% dos cargos gerenciais em Minas eram ocupados por mulheres, enquanto o percentual nacional alcançou os 39,3%. Registra-se que, dos 11 anos em análise, a proporção de mulheres em cargos gerenciais no estado foi superior à média nacional em 4 anos, sendo o mais recente em 2021.

Mesmo quando alcançam cargos gerenciais, as mulheres têm rendimentos médios muito inferiores aos recebidos pelos homens nas mesmas posições. Em 2022, em Minas Gerais, o rendimento médio de mulheres nesses cargos era de R$5.237, enquanto o dos homens foi de R$8.498 – o que corresponde a um rendimento médio 62,3% maior para os homens.
Direitos humanos das mulheres e meninas
Ambientes doméstico e familiar são mais hostis às mulheres
A última seção do informativo trata de dois indicadores: percentuais de pessoas de 18 anos ou mais que sofreram violência física no último ano, por tipo de agressor e local da ocorrência; e proporção de mulheres de 18 anos ou mais de idade que sofreram violência psicológica, física ou sexual nos últimos 12 meses e cuja forma mais grave de violência foi praticada por parceiro íntimo atual ou anterior.
De acordo com dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019, em Minas Gerais, 43,4% dos homens que relataram ter sofrido violência física nos 12 meses anteriores afirmaram que a agressão foi perpetrada por pessoa conhecida; entre as mulheres, a proporção de agressões por pessoas conhecidas salta para 85,9% - dado este que revela um cenário de maior vulnerabilidade para as mulheres dentro do próprio domicílio ou em ambientes familiares. Quando questionadas sobre o local de ocorrência da agressão (única ou mais grave), 68,9% das mulheres reportaram agressões na própria residência, proporção que representa mais do que o dobro daquela levantada entre os homens (34,1%). Ainda segundo a PNS 2019, 6,5% das mulheres de 18 anos ou mais em Minas Gerais reportaram alguma forma de violência física, psicológica ou sexual praticada por parceiro íntimo nos últimos 12 meses.
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