A Biblioteca Pública de Ouro Preto, em parceria com a Batalha da Pracinha, apostando na inovação para proporcionar um espaço de fala à juventude, realizou uma batalha de rap que culminou na grande final, ocorrida no último dia 23 de dezembro, domingo, às 17h com a participação de cerca de 30 mc’s e dezenas de expectadores de diversos bairros da cidade.
A colocação teve como campeã uma mulher, Tatá, (@tatamc01) de Itabirito, reforçando a presença da mulher onde ela quiser estar. “Eu quero agradecer a toda a organização, à Batalha da Pracinha, à galera de Ouro Preto que sempre me recebeu muito bem, desde a minha primeira participação. Foi muito legal sair campeã. É a segunda batalha consecutiva que eu consigo sair campeã. Foi muito legal ver muitas meninas vibrando porque esse também é um espaço nosso, de voz e de fala onde a gente está conseguindo o nosso espaço. Eu quero transmitir o que penso para o meu ouvinte e é isso”, disse a campeã.

Cleusmar é diretor da Biblioteca e destacou que “a biblioteca cumpre a função social de amplificar a voz da juventude, proporcionando a eles a oportunidade de expressar sua visão de mundo”.
Em Ouro Preto a batalha foi produzida em conjunto pelo MC Gagu 013, de Ouro Preto; com apoio do Mc Du P.A na Voz, de Itabirito e Mc Bomblack, de Mariana. Cada um falou de suas experiências e sobre os critérios para fazer da batalha um espaço de expressão e crescimento, sem esquecer da qualidade na rima.
Gagu conta que teve várias vivências negativas e que encontrou na batalha de rap um solo fértil para se tornar uma pessoa melhor. “Foi quando eu encontrei o rap e as batalhas de rima que começaram na pracinha da Bauxita. Vi o evento no facebook e comecei a colar com o pessoal e foi daí que começou a iniciativa e a minha história com o rap”, conta Gagu 013.
Gagu explicou que o critério para a batalha é a qualidade da rima. “Rima ganha de Rima. Os Mc’s entram num duelo querendo mostrar o seu melhor, talvez com uma história que seja convincente a quem está ouvindo. Às vezes o Mc quer rimar pra ganhar, noutras ele quer apenas expressar seus sentimentos, as dificuldades da sua quebrada ou na própria casa mesmo”, detalhou.

Du P.A na Voz é de Itabirito e auxiliou na produção do evento. Ele contou que prefere começar uma batalha mandando uma vivência, antes de partir para o ataque frontal.
Para Du, o principal treinamento “é rimar naturalmente com as coisas do ambiente, porque eu acho que isso evolui a nossa mente. Faço freestyle e verso para mudar a perspectiva e hoje vocês estão lendo Du P.A aqui no Voz Ativa!”, finalizou aplaudido pelos presentes na sala de leitura da biblioteca.
Bomblack, morador de Mariana gosta de teatro e poesia. Conheceu o rap na igreja, em atividades desenvolvidas como alternativa para a juventude do bairro. O seu gosto musical foi se definindo e o rap ganhou força na sua vida partir da dança do breakdance, também conhecido como breaking ou b-boying. Estilo de dança urbana, parte da cultura do hip hop criada por afro-americanos na década de 1970 na cidade de Nova Iorque.
“Comecei no hip-hop na igreja, dançando o break. Na igreja sempre rolava rap para tirar a juventude das drogas. Eu era novinho e gostava muito de dançar e eram formadas algumas equipes com pontuação quem dançava melhor. Eu fui vivenciar o rolê de batalha com jovens de Mariana. A escola abriu esse espaço e aí eu tive minha primeira experiência com a rima. Nunca mais parei”, disse Bomblack.
Vários MC’s de Ouro Preto, Mariana, Itabirito e Belo Horizonte marcaram presença. Entre os jovens presentes, nós conversamos com Mano Espanha, cantor e compositor da banda La Corporação, e que aproveitou a entrevista para divulgar o primeiro álbum gravado em estúdio, disponível nas plataformas de streaming, como o Spotify. Ele revela sua veia realista acentuada a partir da vivência urbana da grande BH, sua cidade natal.

“A gente canta vivências reais, sangrentas e românticas. A cena de Belo Horizonte atualmente está bem forte, tem muita gente com talento aparecendo como EDR, PH21, Nobert, Lohan, então, a cena desse ano aí foi sinistra”, disse Mano Espanha, que completou parabenizando o PH21 pelo primeiro lugar na batalha de Belo Horizonte 2023.
Espanha, tem como parceiros de banda e de caminhada o Big Z, e a Mina Japa, pseudônimo de Jéssica, integrante da La Corporação. Representante da banda na batalha de Ouro Preto, Mina Japa disse que o trabalho é desafiador, embora seja, também, satisfatório o mundo das batalhas.
“Geralmente as batalhas são mais hostis e é uma questão de ataque mais no pessoal. Pra mim, a batalha consiste em expor ideias de como eu enxergo o mundo. Há machismo e algumas vezes até frases facistas, mas isso tudo é superado quando uma Mc está preparada”.
Perguntada se as batalhas servem como ferramenta de transformação social, Mina Japa não hesitou em contar sua história de vida. “Quando eu comecei a fazer freestyle eu estava quase desistindo da minha vida e esse espaço de vivência me mostrou um novo sentido de viver”, concluiu.

Big Z é um jovem maduro e articulado com as palavras. Durante a entrevista falou sobre as dificuldades vividas na infância e da importância do rap na sua construção pessoal, moral e de caráter.
“Na minha vida eu não tinha nada, mas almejava tudo. Vim de uma família simples, como a maioria das pessoas do nosso país. Eu vivi muitas experiências nas batalhas. No Palmital em Santa Luzia eu vivi muita coisa boa. Para mim, o hip-hop foi um fator de crescimento pessoal e eu até fiz uma tatuagem sobre esse tema. A juventude da periferia quer ter um pisante doido, uma roupa de marca e muita gente cai no crime para conseguir isso. O hip-hop me mostrou que há outras formas de conseguir isso de forma digna e sem prejudicar ninguém”, compartilhou Big Z.
Deivid Edson da Silva é faixa vermelha ponta preta de Taekwondo, a penúltima, considerando a faixa preta e jogou capoeira no Grupo Cativeiro, além de ser um dançarino emblemático do break e entusiasta do hip-hop em Ouro Preto.
A presença de Deivid não poderia faltar nesse evento, afinal é ouvinte assíduo de hip-hop desde 1998, quando ingressou com o grupo Conexão Hip-hop do bairro Piedade, passando pela dança de rua em 2002 com o grupo Superstar Break. Deivid, que também fez parte do respeitadíssimo Stúdio Id – Investiga Dança, hoje Estúdio Variação.
Ele conta que desde 1998 até os dias atuais sempre procura trabalhar o corpo e a mente, focar na saúde e nunca se esquece do hip-hop. Perguntado sobre a relevância da batalha ser realizada no espaço da biblioteca, ele avalia que “só por estar dentro de uma biblioteca e imaginar que essa galera jovem está lendo pra conseguir batalhar é uma vitória do rap e do hip-hop. Hoje essa juventude está lendo pra entrar numa batalha, mesmo na era do tik tok”, avaliou.

O Jornal Voz Ativa enaltece a iniciativa do diretor da Biblioteca, Cleusmar, bem como de toda a sua equipe, pela sensibilidade em compreender que os jovens precisam ecoar sua voz ativa!
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