Em 1964, Roberto e Erasmo Carlos compuseram Festa de Arromba e registraram alguns ícones da música nacional em um sucesso que mesclava a batida da jovem guarda com a primeira fase dos Beatles. Em 1977, Rita Lee destila ironia para perguntar o que acontecia com a música popular brasileira, em “Arrombou a festa”.
Duas décadas depois, foi a vez do rapper Gabriel, o pensador mapear alguns dos nossos maiores artistas em “Festa da Música Tupiniquim”. E Lulu Santos, em 2000, reiterou a multiplicidade da nossa música em “Made in Brazil”, ironizando o tempo em que a gente era, segundo ele, “caricatura de americano”.
Polêmicas à parte, é possível afirmar que qualquer lista ou ranking de melhores sempre estará envolta por paixões, discordâncias e discussões. E claro, sempre irá faltar um artista ou banda que faz parte da memória musical de quem a lê.
Por isso, antes de apresentar a lista com as 500 maiores músicas de todos os tempos, o melhor a fazer é explicar como ela surgiu para pontuar suas escolhas.
Bizz: A revista que mudou a história da música brasileira
Até chegar a este ranking, é preciso relembrar a extinta Revista Bizz, que foi o maior informativo sobre música e cultura pop nas décadas de 1980 e 1990. A história dela data de 1985, junto com a abertura política do país e da realização do maior evento musical até aquele ano, o Rock in Rio I. Com o estouro do rock brasileiro - além da notoriedade dos artistas da década passada, que começavam a se tornar referências para a música brasileira - a Bizz “abrasileirou” um tipo de jornalismo que já fazia sucesso lá fora desde o ano de 1967, com a criação da revista Rolling Stone. E chegou ao mercado apenas um ano após a criação do semanário da Billboard, fundado em 1984.
De Bizz a Showbizz e, de novo, a Bizz
Por aqui, a Bizz se tornou Showbizz em outubro de 1995 e foi impulsionada pelo boom causado pela MTV Brasil. Contudo, o declínio deste tipo de publicação começou a acontecer na virada para o século 21 e, em julho de 2001, a revista deixou de ter periodicidade e passou a ser publicada apenas em edições especiais.
Em 2005, novamente com o nome de Bizz, a revista foi relançada, tendo um triste fim, em definitivo, no ano de 2007. Naquele momento, o editor chefe era o jornalista e escritor Ricardo Alexandre, que trabalhou por anos no caderno musical do Estado de São Paulo e escreveu artigos sobre música e cultura pop para a Superinteressante, Revista MTV, Capricho, Carta Capital e outros.
Além disso, após o encerramento da Bizz, Alexandre escreveu 7 livros sobre música, com destaque para “Dias de Luta: o rock e o Brasil dos anos 80”, “Cheguei bem a tempo de ver o palco desabar: 50 causos e memórias do rock brasileiro (1993-2008)” e a biografia “Não vem que não tem - A vida e o veneno de Wilson Simonal”. E merece atenção também seus 5 documentários, onde se destaca entre eles o “Banguela records - A turma de 94” (2015), que conta a criação do selo musical criado por Carlos Eduardo Miranda e os Titãs e revelou Raimundos, Mundo Livre, Júpiter Maçã e outros que, inclusive, fazem parte desta lista das 500 maiores músicas brasileiras de todos os tempos.
Das páginas da Bizz para um podcast de sucesso
Um dos grandes sucessos da revista Bizz foi, durante todo o período em que circulou nas bancas, sua última página, que tinha o autoexplicativo título de “Discoteca Básica”. Nele, um jornalista musical era convidado para discorrer sobre um disco clássico da música mundial, pontuando os sucessos, quem estava envolvido na criação e o contexto da obra com o momento em que foi lançada. Ao todo, 215 discos foram “dissecados” na coluna, e anos mais tarde, quando o podcast se tornou a febre entre as novas mídias, Ricardo Alexandre deu o mesmo nome ao seu programa semanal via streaming.
Confira aqui todos os discos da coluna Discoteca Básica
Segundo ele, as missões principais do podcast Discoteca Básica são um convite à uma relação imersiva, intencional, com profundidade estética e histórica com os álbuns listados. Além disso, ele propõe uma contextualização, reflexão e análise sobre os grandes álbuns da história, através de uma pesquisa cuidadosa e a participação especial de um nome que converse diretamente com o disco em questão.
Cada temporada possui 16 episódios semanais, de 60 minutos, e são levadas ao ar às segundas-feiras, nas principais plataformas de streaming. Entre os principais álbuns e convidados, já tiveram Herbert Vianna falando sobre Beach Boys, o DJ KL Jay sobre Tim Maia, Pitty sobre Amy Winehouse e Teresa Cristina sobre Cartola.
Do podcast à lista dos 500 maiores álbuns brasileiros de todos os tempos
Em 2022, Ricardo Alexandre e a equipe do podcast decidiram organizar o primeiro projeto offline do Discoteca Básica. Para isso, produziram um livro de 200 páginas em capa dura, onde foi feito um ranking dos 500 maiores álbuns de todos os tempos.
Além da lista em si, o livro traz histórias por trás dos trabalhos, fotos raras, muita informação e curiosidade num guia que busca mapear os mais diversos estilos da música brasileira, seja para colecionadores mais experientes quanto pessoas que estão começando a descobrir os clássicos nacionais.
Critérios para escolher os 500 maiores álbuns brasileiros
Já no prefácio, o autor do livro explicou a ambição do projeto, como ler o livro do jeito certo e quais os perigos em lê-lo da maneira errada. Isso porque, segundo ele, não se trata de uma lista de “melhores discos”. Ou seja, o ranking não determina que o primeiro colocado seja melhor que o 427º, por exemplo.
Com isso, a seleção coloca a música brasileira sem qualquer competitividade e apenas cria uma tabulação a partir do voto de 162 especialistas em cultura musical, entre jornalistas, músicos, pesquisadores, historiadores, produtores, repórteres, DJs, VJs, documentaristas, apresentadores e afins.
Cada um deles enviou uma lista pessoal com seus 50 álbuns brasileiros obrigatórios em qualquer coleção e a lista foi organizada a partir destes votos. E ela está aberta para opiniões divergentes, para redescobrir artistas pouco conhecidos ou mesmo confirmar o quanto a música brasileira é plural, diversa e universal.
Escolha das 500 maiores músicas brasileiras de todos os tempos
Por fim, a playlist organizada neste conteúdo foi feita com base no livro “Os 500 maiores álbuns brasileiros de todos os tempos”, na mesma ordem em que eles aparecem.
Para selecionar as canções, foi utilizado o Spotify, a plataforma mais popular de streaming no Brasil. Nele, ao acessar o álbum, incluímos na playlist a música com o maior número de audições do disco que consta no ranking.
Em resumo, há álbuns com diversos sucessos, mas apenas a mais tocada do disco figura no ranking.
E você, qual disco ou música faltou nesta lista das 500 maiores músicas brasileiras de todos os tempos?
Algumas curiosidades sobre os maiores discos e músicas brasileiras
O disco mais citado entre os votantes é mineiro
Clube da Esquina (1972), de Milton Nascimento e Lô Borges foi o mais lembrado no ranking dos maiores álbuns brasileiros de todos os tempos. E não é por menos! Com sucessos como “O trem azul”, “Um girassol da cor do seu cabelo”, “Clube da esquina” e “Paisagem na janela”, o álbum chega a 5 décadas como um disco irretocável e emocionante.
Paisagem na janela e a história da canção (Que não foi feita em Ouro Preto)
Há uma lenda que diz que Lô Borges e Fernando Brant fizeram Paisagem na janela em Ouro Preto. Outra, diz que foi em Diamantina. Contudo, ainda que seja menos poética do que se a criação tivesse sido em uma das belas cidades barrocas, a tal janela que eles citam na canção é da casa da família Brant, no bairro Funcionários em BH.
Então, a igreja e o sinal de glória, pela localização da residência, seria a Matriz de Lourdes, conforme o especial do Estado de Minas sobre o compositor.
Rio de Janeiro lidera o ranking de onde as músicas foram lançadas
De acordo a lista das 500 maiores músicas brasileiras de todos os tempos, apenas o Rio de Janeiro tem 53,4% dos registros. Ou seja, 267 músicas foram gravadas em solo carioca. Porém, isso não é tão incomum assim, já que o Rio contou, por muitos anos, com os melhores estúdios de gravação do país.
Em seguida, vem São Paulo com 31,9% (159 canções). Minas Gerais está em 4 º lugar com apenas 4 registros (0,75%), logo atrás da Bahia, com 14 músicas (2,8%).
Belo Horizonte é a 6ª na lista das cidades natais dos artistas
Em relação à cidade natal dos artistas que emplacaram canções no ranking das 500 maiores músicas brasileiras de todos os tempos, a capital mineira aparece logo atrás de Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Santo Amaro e Porto Alegre.
A música mais antiga da lista e a mais nova
Na lista das 500 maiores músicas brasileiras de todos os tempos, “É doce morrer no mar”, de Dorival Caymmi, é a mais antiga, gravada em 1954. Por outro lado, AmarElo, de Emicida, aparece ao lado de Bixinho, de Duda Beat, como as mais novas de todo o ranking, lançadas em 2019.
Década de 1970 é que tem mais músicas entre as maiores
Entre as 500 maiores músicas brasileiras de todos os tempos, a década de 1970 contribui com o total de 199 canções, sendo a década mais citada. Logo em seguida, vem a década de 1980 com 103 músicas e a década de 1990 com 63 faixas.
Artistas mais citados entre as 500 maiores músicas brasileiras de todos os tempos
Caetano Veloso aparece com 14 canções, entre composições solo e participações com o Doce Bárbaros e Mutantes.
Em seguida, Gilberto Gil tem 11 canções. Com a medalha de bronze, Gal Costa, Rita Lee (em trabalho solo) e Roberto Carlos pontuam com 7 músicas na lista.
Importante: Alguns álbuns não se encontram disponíveis no Spotify. Para estes, foi considerada a canção mais popular do álbum e inserido de outro disco. Os álbuns ausentes na plataforma são, por ordem do ranking:
71º | João Gilberto — João Gilberto (1973)
85º | Marcelo D2 — À procura da batida perfeita (2003)
153º | Taiguara — Imyra, Tayra, Ipi, Taiguara (1976)
196º | Som nosso de cada dia — Snegs (1974)
257º | Elizeth Cardoso, Jacob do Bandolim, Zimbo Trio e Conjunto Época de Ouro (1974)
277º | Boca Livre — Boca Livre (1979)
278º | Cauby Peixoto — Cauby! Cauby! (1980)
320° | Jacob do Bandolim & Seu Conjunto Época de Ouro (1967)
339° | Pixinguinha e os chorões daquele tempo — 5 Companheiros (1958)
341° | Olivia Byington — Corra o risco (1978)
345° | Zizi Possi — Sobre todas as coisas (1991)
349° | Patife band — Corredor polonês (1987)
358° | Edu Lobo — A música de Edu Lobo por Edu Lobo (1965)
378° | Nana Caymmi e Cesar Camargo Mariano — Voz e suor (1983
381° | Thaíde & Dj Hum — Pergunte a quem conhece (1989)
402º | Dorsal Atlântica — Antes do fim (1986)
418º | Blitz — Radioatividade (1983)
425º | Monsueto — Mora na filosofia (1962)
429° | Chiquinha Gonzaga — A maestrina (2000)
447º | Wilson das Neves — Som quente é o das neves (1969)
459º | Noriel Vilela — Eis o “ôme” (1969)
467º | Orquestra Afro-brasileira — Orquestra Afro-brasileira (1968)
476º | Arthur Moreira Lima — Interpreta Ernesto Nazaré (1975)
* Wendell Soares é jornalista, pós-graduado em Marketing Digital, escritor, redator SEO, Social Media e aficionado pelo universo e cultura pop. Nascido em Ipatinga, se considera ouro-pretano de coração.
Que trabalho maravilhoso.
Muita pretensão e pouco conteúdo além de flagrante queda, inexplicável no contexto geral, por Gil e Caetano.