As Duas Faces de Ouro Preto por Elisabeth Camilo

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Por Tino Ansaloni Publicado em 19/04/2012, 15:09 - Atualizado em 20/05/2012, 15:19
Em um trabalho de reportagem vinculado ao aspecto da arquitetura local, recebi de uma simpática moradora de Ouro Preto uma groselha natural, ou seja, a fruta vermelha e fresca, um presente para os olhos e uma preciosidade para o paladar. Alguns meses depois, retornei à casa na Rua Direita e delicadamente requeri da moradora uma mudinha da fruta, que aliás, cresceu e será replantada próximo ao meu muro. Uso este exemplo para ilustrar como é possível viver compartilhando duas faces de uma mesma cidade. Olhamos os casarões coloniais do centro de Ouro Preto, tão fotografados e tão fotogênicos e imaginamos o luxo e o status do morador. Entretanto, quando adentramos a casa, acabamos por perceber que nela há um quintal, com laranjeira, limoeiro, bananeira, um canteiro de ervas medicinais, outro de salsa e cebolinha... Estou no distrito? Não, estou na sede, sem árvores nas ruas porque são estreitas e seria preciso decidir se há lugar para carro ou para árvore. Há pouco tempo li no facebook que uma atriz global nunca tinha visto uma vaca ou uma galinha. É possível já que há jovens em Belo Horizonte que só conhecem cães e gatos. Entretanto, se saímos a apenas cinco minutos caminhando da área central, vamos ver galos e galinhas ciscando tranquilamente em quintais, bodes e cabras descendo ladeiras e um cavalo e alguns jumentos comendo capim sempre verde próximos ao posto de atendimento turístico do Veloso... Pasta o gado e a gente fica olhando, ora para um lado, ora para outro, deixando nosso espírito voar como se confuso, ora para o rural ora para o urbano, sem sair do lugar. Descemos uma rua pacata e ali parece que jardins foram estrategicamente colocados diante de casas muito simples. Se entramos nas mesmas, percebemos que são enormes, maiores do que as casas do centro, além de serem vestidas de sol e de clorofila, com uma nespereira (aqui confundida com ameixeira) temporona e um abacateiro sempre farto. Invade-nos a idéia de morar ali, para sempre, longe das guerras urbanas . De fruta em fruta, fazemos a feira nas casas dos vizinhos ou mesmo na rua. As goiabeiras são generosas, as ramas de maracujá enfeitam os muros e araçás são imortalizados em algumas casas. Pêssegos nascem nas matas juntamente às abóboras e às jabuticabas. Voltando à guerra urbana, quando se mata alguém em Ouro Preto, a notícia se espalha rapidamente. As pessoas cochicham entre si, assustadas porque “Ouro Preto não é lugar onde isso acontecia”. Todavia, podemos ver policiais conversando com o morador e o turista tranquilamente e a vida seguindo seu ritmo sem grandes frenesis. O trânsito fica complicado às vezes em algumas vias, principalmente na entrada e na saída da Rua Pandiá Calógeras, Morro do Gambá para os mais velhos, e no estreitamento do Alto da Cruz. Ao cair da noite, parece que estamos em Belo Horizonte. No resto do dia, a calmaria se estabelece e as crianças vão e vêm sem problemas. Às seis horas da manhã ou da tarde, alguma igreja deixa sua voz no ar, através dos sinos. Parece uma despedida do dia ou da noite e uma saudação de boas vindas para o outro ciclo. E a gente caminha pela cidade como se turista fôssemos, sem sermos incomodados. Também não se sentem importunados os vips que aqui desembarcam. Aqui, fã não corre atrás do artista: ele se torna pessoa comum, com direito a entrar no bar e comer uma empadinha sem paparazzi. Diante de roubos colossais que tomam toda a pauta dos jornais, aqui eles ocorrem em escalas mínimas. Ninguém ainda preocupado com ladrão, deve ser isso que pensa o turista que sai do hotel de manhã para passear pela cidade e vê sacolas com pão dependuradas de porta em porta (pão fiado, a ser pago apenas quando o pagamento sair). Agora que despertei sua curiosidade, responda-me, caro leitor: em que cidade você vive, na urbana ou na rural, ou a partir de agora você se sente confuso, meio surpreendido porque vive nas duas ao mesmo tempo? Elisabeth Camilo

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